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A Caverna dos Antigos (4)

caverna-dos-antigos-lobsang-rampaEste é um livro que trata do Oculto e dos Poderes do Homem. É livro simples, no sentido de que nele não há “palavras estrangeiras”, palavras em sânscrito, nem coisa alguma de línguas mortas. A pessoa média quer SABER as coisas, e não ficar a adivinhar palavras que o autor médio tampouco compreende!

Se um autor sabe trabalhar, pode escrever, sem ter de disfarçar sua falta de conhecimento com o emprego de uma língua estrangeira. Um número demasiado de pessoas deixa-se envolver pela confusão. As leis da Vida são realmente simples; não há necessidade alguma de revesti-las de cultos místicos ou pseudo-religiões. Tampouco existe qualquer necessidade de que alguém afirme ter tido “revelações divinas”. QUALQUER PESSOA pode obter as mesmas “revelações”, se se esforçar por alcança-las…

Edição e imagens:  Thoth3126@protonmail.ch

T. LOBSANG RAMPA, e o livro “A CAVERNA DOS ANTIGOS”

Nenhuma religião tem em si as Chaves do Céu, nem pessoa alguma será condenada para sempre, por ter entrado em uma igreja com o chapéu na cabeça, ao invés de tirar os sapatos. À entrada das lamaserias tibetanas, lê-se a inscrição: “Mil monges, mil religiões”.

lobsang_rampaQualquer que seja nossa crença, se ela englobar o “faze ao próximo o que queres que te seja feito”, teremos êxito, quando soar o Chamamento final. Alguns dizem que o Conhecimento Interior só pode ser obtido ingressando-se neste ou naquele culto, ao mesmo tempo em que se faça o pagamento de uma contribuição substancial.

As Leis da Vida dizem: “Procura e encontrarás”. Este livro é o fruto de toda uma vida, de ensinamentos obtidos nas grandes lamaserias do Tibete e de poderes conquistados por uma observância rigorosa das Leis. Trata-se de conhecimento transmitido pelos Antigos, e se acha inscrito nas Pirâmides do Egito, nos Altos Templos da Cordillheira dos Andes e no maior de todos os repositorios de conhecimentos ocultos do mundo, o Planalto do Tibete – T. LOBSANG RAMPA [Nasceu: Cyril Henry Hoskin-8 April 1910, em Plympton, Devon, United Kingdom – Morte: 25 January 1981 (aged 70) Calgary, Alberta, Canada]


Capítulo 4

Estávamos no tempo de Logsar, o Ano Novo Tibetano. Nós, chelas — e também os trapas —, tínhamos estado ocupados por algum tempo, preparando imagens de manteiga. No ano anterior não nos tínhamos dado a esse trabalho, e isso ocasionara certo mal-estar; outras lamaserias haviam declarado (e corretamente!) que nós, de Chakpori, não tínhamos o tempo ou o interesse para tais atividades infantis. Aquele ano, então, por ordem de O Mais Precioso, tivemos de fazer imagens de manteiga e entrar no torneio.

Nosso esforço foi modesto, comparado ao de algumas lamaserias. Sobre uma estrutura de madeira, com perto de vinte palmos de altura, por trinta de comprimento, nós modelávamos em manteiga colorida diversas cenas tiradas dos Livros Sagrados. Nossas figuras eram inteiramente tridimensionais, e contávamos que, quando vistas à luz bruxuleante das lâmpadas de manteiga, apresentariam uma ilusão de movimento. Sua Santidade em pessoa, bem como todos os lamas de maior graduação, examinavam as exposições todos os anos, e muito louvor era dado aos vitoriosos. Após a época de Logsar, a manteiga era derretida e utilizada nas lâmpadas, durante o ano.

Enquanto eu trabalhava — ainda tinha alguma habilidade na modelagem — pensava em tudo que aprendera nos últimos meses. Certas coisas a respeito da religião ainda me intrigavam, e decidi falar com meu guia, o Lama Mingyar Dondup, a respeito das mesmas, na primeira oportunidade que tivesse, mas, agora, a escultura em manteiga era a ocupação! Eu me, abaixei e raspei uma carga nova de manteiga colorida, subindo cuidadosamente no tapume, de modo a poder modelar a orelha em proporções de Buda. À minha direita, dois jovens chelas travavam uma guerra de manteiga, apanhando punhados da mesma, modelando-os mais ou menos em forma de bola, e depois atirando o projétil pegajoso sobre o “inimigo”.

Divertiam-se à grande, mas por azar um monge-inspetor surgiu, por trás de uma coluna de pedra, para ver qual era a causa de tanto alarido. Sem pronunciar uma só palavra, ergueu ambos os meninos, um com a mão direita e o outro com a esquerda, atirando-os dentro de uma dorna com manteiga quente! Eu me voltei, e prossegui trabalhando. A manteiga misturada com fuligem de lâmpada formava sobrancelhas muito apropriadas. A ilusão de vida já estava presente na figura. “Este é o Mundo de Ilusão, afinal de contas”, estava pensando. Desci, seguindo pelo chão para poder olhar melhor o trabalho. O Mestre de Artes sorriu para mim; talvez eu fosse seu aluno favorito, pois gostava de modelar e pintar, e me esforçava realmente por aprender com ele.

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LHASa a capital do Tibete e o palácio Potala.

—Estamos indo bem, Lobsang, — disse êle, em tom agradável. — Os Deuses parecem vivos. Afastou-se também, para poder ordenar modificações em outra parte do cenário, e eu pensei: “Os Deuses parecem vivos! Existem Deuses? Por que nos ensinam a respeito deles, se não existe um só? Preciso perguntar a meu guia”. Imerso em pensamentos, raspei a manteiga das mãos. Ao canto, os dois chelas que haviam sido jogados na dorna de manteiga quente procuravam limpar-se, esfregando os corpos com areia escura e fina, e tinham um aspecto muito embaraçado, enquanto o faziam. Eu dei uma risada, e me voltei para ir embora. Um chela atarracado andava a meu lado e observou:

—Até os Deuses devem ter rido disso!

“Até os Deuses… Até os Deuses… Até os Deuses”, e esse refrão se repetia em meu espírito, sincronizado com minhas passadas. Os Deuses, existiam Deuses! Desci para o templo e me instalei, à espera de que começasse o serviço religioso conhecido.

—Ouçam as Vozes de nossas Almas, todos vocês que vagueiam. AQUI é o Mundo de Ilusão. A Vida é apenas um sonho. Todos os que nascem têm de morrer. A voz do sacerdote prosseguia em sua récita, nas palavras conhecidas, palavras que agora despertavam minha curiosidade.

—O terceiro bastão de incenso é aceso, para chamar um fantasma errante, para que possa ser guiado. “Não é ajudado pelos Deuses”, eu pensava, “mas guiado por seus semelhantes, por que não pelos Deuses? Qual o motivo pelo qual orávamos ao nosso Eu Maior e não a um Deus?” O resto do serviço não tinha qualquer atrativo, nenhum significado para mim. Fui despertado de meus pensamentos por um cotovelo que me cutucava violentamente as costelas.

—Lobsang! Lobsang! O que houve com você, está morto? Levante-se, o serviço acabou! Levantei-me desajeitadamente, acompanhando os demais que se retiravam do Templo.

—Senhor! — disse a meu guia, o Lama Mingyar Dondup, algumas horas depois. — Senhor! Existe um Deus? Ou Deuses? Ele olhou para mim, e respondeu:

—Vamos sentar-nos no telhado, Lobsang. Quase não se pode conversar aqui, neste lugar cheio de gente. Voltou, seguindo à frente pelo corredor, passando pelos alojamentos dos lamas, subindo o poste entalhado e assim chegamos ao telhado. Por momentos, permanecemos na contemplação da cena amada, as cordilheiras imensas, a água brilhante do Kyi Qiu, e do Kaling Chu orlado de juncos. Por baixo de nós, o Norbu Linga, o Parque das Jóias, parecia uma massa de verde vivo. Meu guia acenou com a mão.

—Você acha que tudo isto seja ocasional, Lobsang? Naturalmente existe um Deus! Dito isto, passamos à parte mais alta do telhado, sentando-nos ali. —Você está confuso em seus pensamentos, Lobsang — afirmou meu guia. — Existe um Deus; existem Deuses. Enquanto estamos nesta Terra, não nos encontramos em condições de perceber a Forma e a Natureza de Deus. Vivemos no que pode ser chamado um mundo tridimensional. Deus vive em um mundo tão distante, que o cérebro humano, enquanto estiver na Terra, não pode abarcar o conceito necessário de Deus, e desse modo os homens tendem a racionalizar as coisas. “Deus” é tomado como algo humano, superhumano, se preferir esse termo, mas o Homem, em sua presunção, acredita ter sido feito à Imagem de Deus! O Homem também acredita que não haja vida em outros mundos. Se o Homem é feito à Imagem de Deus, e os povos de outros mundos são de imagem diferente… o que aconteceria a nosso conceito de que o Homem, somente ele é feito à Imagem de Deus? O lama fitou-me com atenção, para ter a certeza de que eu lhe acompanhava as observações. Isso era fora de dúvida, pois tudo aquilo parecia evidente por si mesmo.

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Representação do EU SUPERIOR

—Todos os mundos, todos os países de todos os mundos, têm seu deus, ou Anjo (deus) Guardião. Nós chamamos ao Deus encarregado do mundo de Manu. É um Espírito altamente evoluído, um ser humano que mediante encarnações sucessivas expurgou a escória de si, deixando apenas o que é puro. Existe um grupo de Grandes Seres que, nos momentos de necessidade, vêm a esta Terra, e podem estabelecer um exemplo pelo qual os mortais comuns conseguem erguer-se do atoleiro dos desejos mundanos.

Eu assenti, pois sabia a esse respeito, sabia que Buda, Moisés, Cristo e muitos outros pertenciam àquela Ordem. Sabia também de Maitreya que, como se acha nas Escrituras Budistas, virá ao mundo 5.656 milhões de anos após a passagem de Buda ou Gautama, como Ele deveria ser chamado com mais precisão. Tudo isso, e mais, fazia parte de nossos ensinamentos religiosos comuns, bem como o conhecimento de que qualquer boa pessoa tem uma oportunidade igual, qualquer que seja o nome ostentado por sua própria crença religiosa. Nunca acreditamos que apenas uma seita religiosa “fosse para o Céu”, e que todas as outras caíssem no Inferno, para o divertimento de amigos sanguinários de todo o tipo. O meu guia, porém, estava pronto a prosseguir.

—Nós (os tibetanos) temos o Manu do mundo, o Grande Ser Evoluído, que controla o destino do mundo. Existem Manus menores, que controlam o destino de um país. Em anos infinitos, o Manu Mundial partirá, e o seguinte, na escala de valores, a essa altura bem preparado, evoluirá, tomará conta da Terra.

—Ah! — exclamei, com certo ar triunfal. — Nesse caso, nem todos os Manus são bons! O Manu da Rússia está deixando que os russos ajam contra o nosso bem. O Manu da China permite aos chineses invadir nossas fronteiras e matar nossa gente.

—Você se esquece, Lobsang, — replicou — de que este mundo é o Inferno, que viemos aqui para aprender lições. Viemos para sofrer, a fim de que nosso espírito possa evoluir. As dificuldades ensinam, a dor ensina, a bondade e a consideração não ensinam. Existem guerras, para que os homens possam demonstrar coragem nos campos de batalha e… como o minério de ferro na fornalha… se temperem e fortaleçam, pelo fogo da batalha. O corpo carnal não importa, Lobsang, ele é apenas um fantoche temporário. A Alma, o Espírito, o Eu Maior (chame como quiser) é tudo quanto deve ser levado em conta. Na Terra, em nossa cegueira, achamos que apenas o corpo importa. O medo de que o corpo possa sofrer obnubila (cega) nossa visão, deforma nosso juízo. Temos de agir pelo bem de nossos próprios Eus Maiores, enquanto continuamos ajudando os outros. Aqueles que seguem cegamente os ditames de pais tirânicos aduzem uma carga aos pais, bem como a si próprios. Os que seguem cegamente os ditames de alguma crença religiosa estereotipada também impedem sua evolução.

—Honrado Lama! — protestei. — Posso aduzir dois comentários ?

—Sim, pode — respondeu meu guia.

— O senhor disse que aprendemos mais depressa se as condições forem duras. Eu preferiria um pouco mais de bondade. Eu conseguiria aprender desse modo. Ele me fitou, pensativo.

—Poderia? — perguntou. — Você aprenderia o que está nos Livros Sagrados, mesmo que não receasse os professores? Faria sua parte de trabalho nas cozinhas, se não temesse o castigo caso ficasse com preguiça? Você faria isso? Eu baixei a cabeça, reconhecendo a razão, pois trabalhava nas cozinhas quando recebia ordens para isso. Estudava os Livros Sagrados porque receava o resultado de não o fazer.

—E qual é sua outra pergunta? — indagou o lama.

—Bem, Senhor, como é que uma religião estereotipada prejudica a evolução da pessoa?

—Eu lhe darei dois exemplos, — respondeu meu guia. — Os chineses acreditavam que não importava o que faziam nesta vida, uma vez que podiam pagar os pecados e faltas quando voltassem outra vez. Assim, adotaram a política da preguiça mental. Sua religião tornou-se um elemento de entorpecimento, levando-os à preguiça espiritual; eles viviam apenas para a vida seguinte, de modo que suas artes e habilidades caíram em desuso. A China assim se tornou uma potência de terceira classe, na qual os chefes de bandoleiros deram início a um reinado de terror e pilhagem.

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Eu observava que os chineses em LHASa pareciam desnecessariamente brutais e de todo fatalistas. A morte, para eles, não representava outra coisa senão a passagem para um outro aposento! Eu não receava a morte de modo algum, mas queria executar minha tarefa em um período de vida, ao invés de relaxar, e ter de voltar a este Mundo, repetidas vezes. O processo de nascer, ser criança indefesa, ter de freqüentar a escola, tudo isso era dificuldade para mim. Esperava que esta vida fosse a última que eu passava sobre a Terra. Os chineses tinham tido invenções maravilhosas, obras de arte igualmente maravilhosas, uma cultura admirável. Ora, por ter aderido a uma crença religiosa de modo demasiadamente servil, o povo chinês se tornara decadente, presa fácil para o comunismo. Em certa época, o conhecimento e a idade haviam merecido respeito profundo na China, como deveria acontecer, mas, agora — os sábios não recebiam mais honras que lhes eram devidas ; tudo que importava, agora, era a violência, o ganho pessoal e o egoísmo.

—Lobsang! — e a voz de meu guia interrompeu meus pensamentos. — Vimos uma religião que ensinava a inatividade, ensinava que não se deve, de modo algum, influenciar outra pessoa, para que não se aumentasse o carma próprio… A dívida que passa de uma vida para a outra. Ele fitou a cidade de LHASa, vendo nosso Vale Pacífico, e voltou-se novamente para mim. —As religiões do Ocidente tendem a ser muito militantes. As pessoas, por lá, não se contentam em acreditar no que eles querem crer, mas estão prontas a matar outras para fazê-las acreditar também.

—Eu não percebo como matar uma pessoa possa ser boa prática religiosa, — observei.

—Não, Lobsang — respondeu o lama —, mas ao tempo da Inquisição espanhola, um ramo dos católicos torturava outro ramo para que os seus componentes pudessem ser “convertidos e salvos”. As pessoas eram postas em máquinas de tortura ou queimadas, para se persuadirem a mudar de crença! Ainda hoje essa gente envia missionários, que procuram, por quase todos os meios, obter convertidos. Parecem estar tão inseguros de sua crença que têm de fazer com que os demais exprimam aprovação e acordo com sua religião… raciocinando, presumivelmente, que a segurança reside nos grandes números de crentes!

—Senhor! — disse eu. — Acha que as pessoas devam seguir uma religião?

—Ora, por certo, se assim o desejarem, — respondeu o Lama Mingyar Dondup. — Se as pessoas ainda não atingiram a etapa (nível evolutivo-consciência) na qual podem aceitar o Eu Maior e o Manu do Mundo, nesse caso sentir-se-ão reconfortadas em aderir a algum sistema formal de religião. Trata-se de uma disciplina mental e espiritual, fazendo algumas pessoas sentirem que pertencem a um grupo familiar, tendo um Pai benevolente a vigiá-las e uma Mãe compadecida sempre pronta a interceder em seu favor junto ao Pai. Sim, para esses, em certa etapa da evolução, tal religião é boa e necessária. Mas quanto mais cedo essas pessoas compreenderem que devem orar ao seu Eu Maior, tanto mais depressa evoluirão. Às vezes perguntam-nos o motivo pelo qual temos Imagens Sagradas em nossos Templos, ou pelo qual temos Templos, afinal de contas. A isso podemos responder que tais Imagens são lembretes de que também podemos evoluir e, com o tempo, tornar-nos altos Seres Espirituais. Quanto a nossos Templos, são lugares onde as pessoas de pensamento semelhante podem reunir-se, a fim de conferir força mútua na tarefa de chegar ao Eu Maior de cada um. Pela oração, ainda que ela não esteja corretamente dirigida, consegue-se alcançar uma cadência maior de vibrações. A meditação e a contemplação dentro de um Templo, de uma Sinagoga, ou uma Igreja, é benéfica.

Fiquei pensando sobre aquilo que acabara de ouvir. Lá embaixo, o Kaling Chu tilintava e corria mais depressa, ao estreitar-se sob a Ponte da Estrada de Lingkor. Para o sul, divisei um grupo de homens à espera do Barqueiro do Kyi Chu. Os comerciantes haviam chegado mais cedo aquele dia, trazendo jornais e revistas para o meu guia. Jornais da Índia e de países estranhos do mundo. O Lama Mingyar Dondup viajara para muito longe e numerosas vezes, mantendo-se em contato atento com as questões do mundo fora do Tibete – Jornais, revistas. Um pensamento seguia subrepticiamente em meu espírito. Algo que tinha a ver com aquela palestra. Jornais? De repente, dei um salto, como se fora mordido. Não os jornais, mas uma revista! Algo que eu vira, e o que era, mesmo? Já sabia! Tudo se esclarecia para mim; eu percorrera algumas páginas, sem compreender uma só palavra das línguas estrangeiras, mas procurando as ilustrações. Uma dessas páginas ficara parada, sob meu polegar investigador. O quadro de um ser alado, pairando nas nuvens, adejando acima de um campo sangrento de batalha. O meu guia, a quem eu mostrara a ilustração, lera e traduzira a legenda para mim.

— Honrado Lama! — exclamei agitado. — Ainda hoje o senhor me falou daquela Figura…. e a chamou o anjo de Mons… que muitos homens afirmam ver acima dos campos de batalha. É um Deus?

— Não, Lobsang — respondeu meu guia —, inúmeros homens, na hora de seu desespero, ansiaram por ver a figura de um Santo ou, como o chamam, um Anjo. Sua necessidade urgente e as emoções fortes inerentes a uma batalha deram vigor a seus pensamentos, aos seus desejos e às suas orações. Assim, do modo como lhe mostrei, criaram uma forma pensamento, de acordo com suas próprias especificações. Quando o primeiro esboço fantasmagórico de uma figura se apresentou, as orações e pensamentos dos homens que o causavam se intensificaram, e a figura adquiriu vigor e solidez, perdurando por bastante tempo. Nós fazemos a mesma coisa aqui, quando “criamos formas pensamento” no Templo Interno. Mas venha, Lobsang, o dia já se adiantou, e as Cerimônias de Logsár ainda não foram concluídas.

Lhasa (Neujahr), Tubenbläser mit Potala, Lamas blasen das Neujahrsfest ein
LHASa 

Seguimos pelo corredor, descendo para o cenário de movimentação, o torvelinho que era a vida cotidiana dentro de uma lamaseria, durante uma Estação de Comemoração. O Mestre de Artes veio à minha procura, querendo um menino pequeno e leve para subir no tapume e fazer algumas alterações na cabeça de uma figura lá em cima. Seguindo atrás dele, fui ter em passos rápidos pela trilha escorregadia até a Sala de Manteiga. Enverguei um manto antigo, que estava liberalmente coberto de manteiga colorida, e atei uma corda leve ao redor da cintura, para poder suspender o material, após o que subi no tapume. Era como o Mestre calculara, parte da cabeça se partira, soltando-se dos sarrafos de madeira. Gritando para baixo o que eu queria, fiz oscilar minha corda e suspendi um balde de manteiga. Trabalhei por algumas horas, retorcendo fragmentos de madeira fina ao redor das escoras, modelando mais uma vez a manteiga para recolocar a cabeça no lugar. Finalmente, o Mestre de Artes, observando com ar crítico lá do chão, indicou que estava satisfeito.

Devagar, entorpecido, desemaranhei-me do tapume e desci lentamente para o chão. Satisfeito, mudei de manto e saí apressadamente. No dia seguinte, eu e muitos outros chelas estávamos na planície de LHASa, ao pé do palácio Potala, na Aldeia de Shö. Em teoria, observávamos as procissões, os jogos, as corridas. Na verdade, estávamo-nos exibindo diante dos peregrinos humildes que congestionavam as trilhas montanhosas, para chegarem a LHASa a tempo para o Logsar. Eles vinham de todo o mundo budista, para ali, a Meca do Budismo. Homens velhos, estropiados pela idade, mulheres novas, carregando crianças ao colo, todos vinham na crença de que, completando o Circuito Santo da Cidade de Potala, estavam expiando os pecados passados e assegurando um bom renascimento na vida próxima sobre a Terra.

Ledores da sorte congestionavam a Estrada de Lingkor, mendigos antigos choramingavam, pedindo óbulos, e vendedores com as mercadorias suspensas sobre os ombros abriam caminho em meio à multidão, procurando fregueses. Logo me cansei daquela cena movimentada, cansei-me da multidão boquiaberta e de suas perguntas sem fim e idiotas. Afastei-me de meus companheiros e, devagar, subi a trilha da montanha para meu lar na lamaseria. Sobre o telhado, em meu ponto favorito, tudo estava calmo. O sol proporcionava um calor suave. Lá embaixo, agora fora de minha visão, surgiu um murmúrio confuso, vindo da multidão, murmúrio esse que em seu caráter indistinto vinha tranqüilizar-me, tornar-me sonolento ao sol do meio-dia. Uma figura de sombra materializou-se quase no limite extremo de minha visão. Sonolento, sacudi a cabeça, pisquei os olhos. Quando voltei a abri-los, a figura ainda estava lá, agora mais clara, tornando-se mais densa. Meus cabelos ficaram em pé, tamanho o susto.

—Você não é um fantasma! — exclamei. — Quem é? A Figura sorriu de leve, e respondeu:

—Não, meu filho, não sou um fantasma. Também já estudei aqui, em Chakpori, e estive neste telhado, descansando, como você o faz agora. Depois, desejei, acima de tudo, acelerar minha libertação quanto aos desejos terrenos. Fiz-me fechar dentro das muralhas daquele eremitério, — indicou, apontando para cima, e eu me voltei para acompanhar a direção de seu braço estendido. — Agora — prosseguiu ele, telepaticamente —, neste décimo primeiro Logsar, desde aquela data, eu consegui o que procurava; liberdade para vagar à vontade, enquanto deixo meu corpo seguro, dentro da cela do eremitério. Minha primeira jornada é para cá, para poder mais uma vez olhar a multidão, para poder visitar de novo este lugar de que me lembro tão bem. Liberdade, menino, eu atingi a liberdade. Diante de meu olhar, ele desapareceu como uma nuvem de incenso dispersa pelo vento noturno.

Os eremitérios! Nós, chelas, havíamos ouvido falar tanto sobre eles… Como seriam, por dentro? Muitas vezes, procurávamos imaginar. Por que motivo os homens se encarceravam dentro daquelas câmaras de pedra, precariamente suspensas à beira da montanha? Também pensávamos sobre isso! Resolvi perguntar a meu amado guia. Depois, recordei-me de que um velho monge chinês vivia a pouca distância de onde eu estava. O velho Wu Hsi levava uma vida interessante; durante alguns anos fora monge adido ao Palácio dos Imperadores em Pequim. Cansado dessa vida, viajou para o Tibete, à procura de esclarecimento. Com o tempo, chegara ao Chakpori e fora aceito. Cansado disso, após alguns anos, fora para um eremitério e por sete anos levara a vida solitária. Agora, porém, encontrava-se de volta em Chakpori, esperando a morte. Eu me voltei e segui apressadamente para o corredor lá embaixo. Fui ter a uma pequena cela, e chamei o velho.

—Entre! Entre! — disse ele, em voz alta e fraquejante. Entrei em sua cela, e pela primeira vez vi Wu Hsi, o monge chinês. Estava sentado, as pernas cruzadas, e, a despeito de sua idade, as costas se mantinham tão eretas quanto um bambu novo. Tinha malares salientes e pele muito amarela, apergaminhada. Os olhos eram inteiramente negros e enviesados. Alguns poucos fios de cabelo apresentavam-se no queixo e do lábio superior pendia uma dúzia, mais ou menos, de pelos de seu bigode comprido. As mãos eram amarelo castanhas, sarapintadas devido à idade avançada, enquanto as veias se apresentavam como os ramos de uma árvore. Ao seguir para ele, fitou cegamente em minha direção, sentindo mais do que vendo.

—Hmmn, hmmn — fez — um menino, um menino bem novo, pelo modo de andar. O que quer, menino?

—Senhor! — respondi. — Vivestes por muito tempo em um eremitério. Tereis, Santo Senhor, a bondade de me falar sobre isso? Ele resmungou, mastigou as pontas do bigode, e depois disse:

—Sente-se, menino, faz muito tempo desde que falei sobre o passado, embora pense constantemente nele, agora. Quando eu era menino — prosseguiu — viajei muito e fui ter à Índia. Ali, vi os eremitas fechados dentro de suas cavernas, e alguns deles pareciam ter atingido o esclarecimento. Dito isso, sacudiu a cabeça, e continuou: —As pessoas comuns eram muito preguiçosas, passavam os dias sob as árvores. Ah! Era uma visão deplorável!

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—Santo Senhor! — interrompi. — Eu preferiria muitíssimo ouvir falar dos eremitérios do Tibete.

—Hem? O que foi isso? — perguntou ele, em tom débil. — Oh, sim, os eremitérios do Tibete. Regressei da Índia, e fui para minha Pequim natal. A vida ali me entediava, pois eu não estava aprendendo. Tomei novamente o cajado, a tigela, e rumei, durante muitos meses, para as fronteiras do Tibete. Suspirei para mim mesmo, começando a ficar exasperado, e o velho prosseguiu:

—Com o correr do tempo, depois de ter permanecido em uma lamaseria depois de outra, sempre à procura de esclarecimento, cheguei a Chakpori. O Abade permitiu que eu ficasse ali, uma vez que eu fora médico na China. Minha especialidade era a acupuntura. Por alguns anos fiquei contente e depois senti um grande desejo de entrar para um eremitério. A essa altura, eu estava quase saltitando de impaciência. Se o velho levasse muito mais tempo, eu chegaria atrasado — e não poderia perder o serviço religioso da noite! Já quando pensava nisso, ouvia o primeiro toque dos gongos. Com relutância, ergui-me e disse:

—Respeitado Senhor, tenho de ir agora. O velho deu uma risadinha.

—Não, menino, — respondeu. — Pode ficar, pois você não está aqui recebendo instrução de um Irmão Mais Velho. Fique, e está dispensado do serviço noturno. Voltei a sentar-me, sabendo que ele dissera a verdade: embora ainda fosse um trapa, e não um lama, ainda assim era considerado um Mais Velho, devido à idade, suas viagens, e experiência. —Menino do chá, chá! — exclamou ele. — Vamos tomar chá, pois a carne é frágil, e o peso dos anos é muito em mim. Chá, para o jovem e para o velho. Em resposta a seu chamamento, um Monge Auxiliar dos Idosos trouxe-nos chá e cevada. Preparamos o nosso tsampa, e nos acomodamos, ele para falar, eu para ouvir.

—O Senhor Abade deu-me permissão para deixar Chakpori e entrar em um eremitério. Com um monge-ajudante, parti deste lugar, e subi para as montanhas. Após cinco dias de viagem, chegamos a um lugar que pode ser visto do telhado daqui. Eu assenti, pois conhecia o lugar, um edifício solitário bem alto nos Himalaias. O velho prosseguiu: —O lugar estava vazio, pois o ocupante anterior morrera recentemente. O Ajudante e eu limpamos tudo, e depois eu me pus a fitar o vale de LHASa pela última vez. Olhei a Potala e Chakpori, depois me voltei e segui para a câmara interna. O Ajudante levantou uma parede na porta, fechando-a com firmeza, e eu fiquei só.

—Mas, Senhor! Como é o interior? — perguntei. O velho Wu Hsi esfregou a cabeça, antes de responder. —É um edifício de pedra — respondeu, devagar. — Um edifício com paredes muito grossas. Não há portas, pois uma vez que se esteja lá dentro da câmara interna, a porta é fechada, levantando-se outra parede firme. Nessa porta há uma passagem, inteiramente à prova de luz, pela qual o eremita recebe comida. Um túnel escuro liga a câmara interna àquela onde vive o Ajudante. Eu fui emparedado. A escuridão era tão espessa que eu quase a podia apalpar. Nem um só vislumbre de luz entrava, nenhum som podia ser ouvido. Sentei-me no soalho e comecei minha meditação. De início, sofri com alucinações, imaginando ver faixas de luz. Depois, senti que a escuridão me estrangulava, como se eu estivesse coberto por lama macia e seca. O tempo deixou de existir. Logo ouvi, com a imaginação, sinos e gongos e o som de homens cantando. Mais tarde bati nas paredes de minha cela, procurando em meu frenesi descobrir uma saída. Não conhecia a diferença entre o dia e a noite, pois ali tudo era tão negro e silencioso quanto o túmulo. Depois de algum tempo, tornei-me calmo, meu pânico desapareceu. Continuei sentado, visualizando a cena, o velho Wu Hsi — o jovem Wu Hsi, então! — na escuridão quase viva, dentro do silêncio total.

—A cada dois dias — disse o ancião —, o ajudante vinha e depositava um pouco de tsampa na parte externa da fresta. Vinha tão silenciosamente que nunca o consegui ouvir. Da primeira vez, apalpando cegamente minha comida na escuridão, eu a derrubei, e não a consegui alcançar. Chamei e gritei, mas nenhum som saía de minha cela; era preciso esperar outros dois dias.

—Senhor! — perguntei. — O que acontece, se um eremita adoece ou morre?

—Meu menino — disse o velho Wu Hsi —, se um eremita adoecer… ele morre. O ajudante deposita comida, a cada dois dias, por quatorze dias. Depois desse tempo, se a comida continua intata, vêm os homens, derrubam a parede, e tiram de lá o corpo do eremita. O Velho Wu Hsi fora eremita por sete anos.

—O que acontece em caso como o seu, quando permaneceu lá o tempo escolhido?

—Permaneci por dois anos, e depois por mais sete. Quando já estava próximo o momento de sair, foi feito o menor buraco possível no teto, de modo que por ali entrasse um feixe diminutíssimo de luz. Após alguns dias, o buraco era aumentado, permitindo que entrasse mais luz. Finalmente, eu conseguia suportar toda a luz do dia. Se o eremita for repentinamente trazido para a luz ficará no mesmo instante cego, pois os olhos se dilataram por tanto tempo na escuridão que já não mais conseguirão contrair-se. Quando saí, estava branco, descorado, os cabelos tão brancos quanto a neve das montanhas. Recebi massagens, fiz exercícios, pois meus músculos estavam quase inutilizados, devido ao desuso. Gradualmente, recuperei minhas forças até que, afinal, consegui, com meu ajudante, descer a montanha para residir novamente em Chakpori.

reencarnaçãociclo

Sopesei suas palavras, pensando nos anos infinitos de escuridão, silêncio absoluto, voltado a seus próprios recursos, e ainda tinha perguntas. —O que aprendeu com isso, Senhor? — perguntei, finalmente. — Valeu à pena?

—Sim, menino, sim, valeu à pena! — disse o velho monge. — Aprendi a natureza da vida. Aprendi qual o fito do cérebro. Tornei-me livre do corpo, e podia mandar o meu espírito a lugares distantes, exatamente como você o faz agora, no plano astral.

—Mas como sabe que não foi sua imaginação? Como sabe que estava lúcido? Por que não viajava no astral, como eu faço? Wu Hsi riu até que lágrimas rolassem por suas faces encarquilhadas.

—Perguntas… perguntas… perguntas, menino, exatamente como eu costumava fazer! — respondeu. “A princípio, fui tomado pelo pânico. Amaldiçoei o dia em que me tornara monge, amaldiçoei o dia em que entrara naquela cela. Gradualmente, consegui acompanhar os modelos de respiração, e meditar. De início, tive alucinações, imaginações vãs. Depois, certo dia, soltei-me de meu corpo e a escuridão já não era mais escura para mim. Vi meu corpo sentado, na atitude de meditação. Vi meus olhos que não enxergavam, fitando a escuridão, arregalados. Vi a palidez da minha pele, a magreza do meu corpo. Erguendo-me, passei pelo teto da cela e vi, lá embaixo, o vale de LHASa. Notei certas alterações, vi pessoas que eu conhecia e, passando pelo Templo, pude conversar com um lama telepático que confirmou, para mim, minha libertação. Vaguei por bem longe, além das fronteiras deste país. A cada dois dias, regressava e entrava novamente no corpo, reanimando-o para que pudesse comer e nutrir-se.

—Mas por que não conseguia fazer a viagem astral sem todos esses preparativos? — Voltei a perguntar.

—Alguns de nós são mortais muito comuns. Poucos de nós possuem a capacidade especial que a você é dada por causa da tarefa que tem de empreender. Também você viajou muito no astral. Outros, como eu, têm de suportar a solidão e a vicissitude, antes que seu espírito possa libertar-se da carne. Você, menino, é um dos afortunados, um dos muito afortunados! O ancião suspirou, e prosseguiu: —Vá-se embora! Preciso descansar, falei muito. Volte amanhã, será um visitante bem-vindo, a despeito das perguntas que faz.

Ele Voltou-se para outro lado e, com um murmúrio de agradecimento, eu me pus em pé, fiz reverência, e saí silenciosamente do quarto. Estava tão ocupado, tomado por pensamentos, que bati diretamente na muralha oposta, e quase arranquei o espírito de meu corpo. Esfregando a cabeça que doía, caminhei com calma pelo corredor, até chegar à minha própria cela. O serviço da meia-noite estava quase findo. Os monges se remexiam de leve, prontos a partirem com pressa para algumas horas mais de sono, antes de voltarem. O velho Leitor, no pódio, Inseriu cuidadosamente uma marca entre as páginas do Livro e voltou-se, pronto a descer de lá. Inspetores de olhar atento, sempre alerta à procura de qualquer perturbação, ou querendo descobrir os meninos desatentos, afrouxaram em sua vigilância. O serviço estava quase encerrado. Pequenos chelas faziam oscilar os turíbulos para o último passe, e se ouvia o murmúrio mal reprimido de um grande número de pessoas que se preparam para mover-se.

De repente, houve um grito penetrante, e uma figura selvagem saltou sobre as cabeças dos monges sentados, procurando agarrar um jovem trapa que segurava dois bastões de incenso. Nós nos pusemos em pé com um salto, tomados de choque. Diante de nós, a figura selvagem rodopiava e girava, a espuma escorrendo de seus lábios enrugados, gritos, horríveis emitidos de sua garganta torturada. Por alguns momentos, o mundo pareceu parar; os monges-policiais ficaram imóveis de surpresa, os sacerdotes oficiantes estavam de braços erguidos. E depois, com violência, os inspetores entraram em ação. Convergindo sobre a figura enlouquecida, logo a dominaram, passando o manto ao redor de sua cabeça, para silenciar as pragas que vinham em torrente de sua boca. Com eficiência e rapidez, ele foi levantado e retirado do Templo. O serviço terminou. Pusemo-nos em pé e nos apressamos a sair, ansiosos por estarmos além das dependências do Templo, para que pudéssemos falar sobre o que tínhamos acabado de ver.

—Esse é Kenji Tekeuchi — disse um jovem trapa perto de mim. — É um monge japonês que tem feito visitas a toda a parte. —Procurando a Verdade, e esperando que lhe entreguem, ao invés de trabalhar para consegui-lapor si mesmo — informou um terceiro.

Eu me afastei, um tanto perturbado. Por que a Busca pela Verdade faria um homem enlouquecer? O quarto estava frio, e eu tiritei de leve, ao deitar-me para dormir. Parecia que nenhum tempo decorrera, até que os gongos voltassem a soar, para o serviço religioso seguinte. Olhando pela janela, vi os primeiros raios do sol surgindo sobre as montanhas, raios de luz que pareciam dedos gigantescos a apalpar o céu, estendendo-se para as estrelas. Suspirei, e segui apressadamente pelo corredor, aflito por não ser o último a entrar no Templo, com o que viria a merecer a ira dos Inspetores.

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—Está com aspecto pensativo, Lobsang, — observou meu guia, o Lama Mingyar Doridup, quando o vi mais tarde, após o serviço do meio-dia. Fez-me sinal para que me sentasse. —Você viu o monge japonês, Kenji Tekeuchi, quando ele entrou no Templo. Quero falar-lhe a respeito dele, porque mais tarde o conhecerá. Acomodei-me melhor, pois aquela não ia ser uma sessão rápida. Eu fora “apanhado” pelo resto do dia! O Lama sorriu, ao ver minha expressão fisionômica. —Talvez devamos tomar chá da Índia.. e bolinhos indianos… para dourar a pílula, Lobsang, hem? Fiquei um pouco mais satisfeito, e ele deu uma risadinha, dizendo: —O ajudante já o está trazendo, porque eu esperava por você! “Sim”, eu pensava, enquanto o monge-criado entrava, “onde mais eu poderia ter um tal Mestre?” Os bolinhos da Índia eram meus favoritos, e os olhos do próprio lama às vezes se esbugalhavam de espanto, diante da quantidade dos mesmos que eu conseguia “eliminar”!

—Kenji Tekeuchi — disse meu guia — é… foi… um homem muito versátil. Viajou muito, e por toda a vida (está agora com mais de setenta anos) vagou pelo mundo, à procura do que ele chama Verdade. A Verdade está dentro dele, mas ele ainda não sabe disso. Ao invés, andou por aí, voltou a andar. Sempre estudou as crenças religiosas, sempre leu os livros de muitas terras diferentes, prosseguindo nessa procura, nessa obsessão. Agora, finalmente, foi nos mandado. Leu tanta coisa de natureza oposta, que ficou com a aura contaminada. Leu tanto, e compreendeu tão pouco, que na maior parte do tempo é demente. Transformou-se em verdadeira esponja humana, absorvendo todos os conhecimentos e digerindo pouquíssimo.

—Então, Senhor! — exclamei. — O senhor se opõe ao estudo pelos livros?

—De modo nenhum, Lobsang! — respondeu o lama. — Eu me oponho, como todos os homens que pensam, àqueles que obtêm as brochuras, os panfletos e os livros escritos acerca de cultos estranhos, tratando do chamado ocultismo. Essa gente envenena a sua própria alma, torna impossível o progresso maior para si mesma enquanto não tenham deixado de lado todos os conhecimentos falsos e não se tenham tornado igual a uma criança pequena.

—Honrado Lama — perguntei —, como alguém fica demente? Como a leitura errada leva à confusão, em alguns casos?

—Trata-se de urna história muito comprida, — respondeu o Lama Mingyar Dondup. — Primeiramente, temos de examinar alguns fundamentos. Tenha paciência, e escute! Na Terra, somos como fantoches, fantoches feitos de moléculas em vibração, cercadas por uma carga elétrica. Nosso Eu Maior vibra em cadência muito mais elevada, e possui carga elétrica muito mais alta. Existe uma relação definida entre nossa cadência de vibrações e aquela de nosso Eu Maior. Pode-se comparar o processo de comunicação entre cada um de nós, nesta Terra, e nosso Eu Maior em outras partes, a um processo que é novo neste mundo, um processo pelo qual as ondas de rádio são enviadas através dos continentes e mares, permitindo assim a uma pessoa, em um país, comunicar-se com outra,, em terra bem distante. Nossos cérebros são semelhantes à receptores de rádio, no sentido de que recebam as mensagens de “alta freqüência”, bem como ordens e instruções, do nosso próprio Eu Maior e as transformam em impulsos de baixa freqüência, que controlam nossas ações. O cérebro é o dispositivo eletromecanicoquímico que nos torna úteis na Terra. As reações químicas levam nosso cérebro a funcionar de modo defeituoso, talvez bloqueando parte da mensagem, porque raramente, na Terra, recebemos a mensagem exata “irradiada” pelo Eu Maior. A Mente é capaz de ação limitada, sem referência ao Eu Maior. A Mente é capaz de aceitar certas responsabilidades, formar certas opiniões, e procura preencher a lacuna entre as condições “ideais” do Eu Maior e as condições difíceis sobre a Terra.

—Mas a gente ocidental aceita a teoria da eletricidade ao cérebro? — perguntei.

—Sim, — respondeu meu guia. — Em certos hospitais, as ondas cerebrais dos pacientes são registradas, tendo sido verificado que certas desordens mentais apresentam um feitio característico de onda cerebral. Assim, com base nas ondas cerebrais, podemos afirmar se uma pessoa sofre ou não de alguma doença ou enfermidade mental. Muitas vezes, uma doença do corpo mandará certas substâncias químicas ao cérebro, contaminando sua forma de onda e apresentando, desse modo, os sintomas de insanidade.

—O japonês está muito doido? — perguntei.

—Venha. Vamos vê-lo agora, pois está em um de seus momentos lúcidos. O Lama Mingyar Dondup pôs-se em pé e saiu apressadamente do quarto. Fiz o mesmo, correndo atrás dele. Ele seguiu à frente pelo corredor, até outro nível, indo ter a uma enfermaria distante, onde ficavam alojados os que recebiam tratamento médico. Em pequena alcova, com visão para o Khati Linga, o monge japonês estava sentado, olhando para fora, com expressão carrancuda. À aproximação do Lama Mingyar Dondup, apertou as próprias mãos e fez uma mesura profunda.

—Sente-se, — disse meu guia. — Trouxe um jovem para ouvir suas próprias palavras. Ele está recebendo instrução especial, por ordem de Sua Santidade. O lama fez uma mesura, voltou-sé e deixou a alcova. Por momentos, o japonês me fitou, e depois fez sinal para que me sentasse. Obedeci, a uma distância conveniente, pois não sabia se ele se tornaria violento!

—Não encha a cabeça com tudo de ocultismo que lê, menino! — disse o monge japonês. — É matéria indigerível, que impedirá seu progresso espiritual. Estudei todas as religiões. Estudei todos os cultos metafísicos que pude encontrar. Isso me envenenou, escureceu-me a visão, levou-me a crer que era um Escolhido Especial. Agora, tenho o cérebro prejudicado, e às vezes perco o controle de mim mesmo… fujo das ordens de meu Eu Superior…

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—Mas, Senhor! — exclamei. — Como se pode aprender, sem ler? Que mal possível pode vir da palavra escrita?

—Menino! — disse o monge japonês. — Certamente se pode ler, mas é preciso escolher com cuidado o que se lê, e ter a certeza de que se entende completamente o que está escrito. Não há perigo na palavra escrita, mas há perigo nos pensamentos que ela pode causar. Não se deve comer tudo, misturando o compatível com o incompatível; tampouco devemos ler coisas que se contradizem, que se opõem umas às outras. Nem se devem ler coisas que prometem poderes ocultos. É muito fácil criar uma Forma de Pensamento, que não se pode controlar, como eu fiz, e em seguida a Forma nos prejudica.

—O senhor já esteve em todos os países do mundo? — indaguei. O japonês me fitou e um brilho leve surgiu em seus olhos.

—Nasci em pequena aldeia japonesa — disse — e quando tinha idade suficiente entrei para o Serviço Sagrado. Durante anos seguidos, estudei religiões e práticas ocultas. Depois, meu Superior me ordenou que partisse e viajasse para países muito além dos oceanos. Há cinqüenta anos, venho viajando de um a outro país, de um a outro continente, sempre estudando. Com meus pensamentos, criei Poderes que não sabia controlar. Poderes que vivem no mundo astral e que, em alguns momentos, afetam meu Cordão de Prata. Mais tarde, talvez, terei permissão para contar-lhe mais. Por enquanto, ainda estou enfraquecido pelo último ataque, e preciso descansar. Com permissão de seu guia, pode visitar-me em outro dia.

Fiz minhas reverências e o deixei na alcova. Um monge médico, vendo que eu partia, apressou-se a ir ter com ele. Com curiosidade, olhei ao redor, espiei os velhos monges deitados naquela parte do Chakpori. E depois, em resposta a um chamamento telepático urgente, apressei-me a ir ao encontro de meu guia, o Lama Mingyar Dondup.

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