A Revelação Templária – 8A – Este é um lugar terrível (Rennes le Chateau)

A Revelação Templária – 8A – Este é um lugar terrível  (Terribilis est locus iste) – Templários, os Guardiões Secretos da Verdadeira Identidade de Cristo

Rennes-le-Château, no Languedoc-Roussillon é um lugar-comum esotérico e ocultista, quase – atualmente – na mesma «linha» do  próprio Graal e igualmente elusivo. Contudo, é uma localidade real, e foi ali que nos encontramos no desenrolar da nossa investigação. Este lugar pode ser comparado a  Glastonbury, na Inglaterra, porque ambos parecem guardar profundos mistérios, apesar de  ambos os locais terem dado origem aos mais absurdos, mas muito divulgados, mitos e suposições.

Capítulo 08 A – ESTE É UM LUGAR TERRÍVEL  – Livro The Templar Revelation – Secret Guardians of the True Identity of Christ”, de  Lynn Picknett e Clive Prince.

CAPÍTULO VIII – A – “ESTE É UM LUGAR TERRÍVEL” (Terribilis est locus iste)

Rennes-le-Château situa-se no departamento do Languedoc, conhecido por Aude, próximo  da cidade de Limoux, que dá o seu nome ao famoso blanquette, ou vinho espumante, da  área que, nos séculos XVIII e XIX, era conhecido por Razès. A partir da pequena cidade de  Couiza, grandes letreiros indicam uma estrada secundária, anunciando o Domaine de Abbé  Saunière. Seguindo estas indicações, os automobilistas encontram-se numa curiosa estrada em espiral que conduz à aldeia de Rennes-le-Château, situada no topo da colina.

Para nós, como para tantas pessoas, hoje em dia, esta é uma viagem excitante. Graças,  principalmente, ao livro The Holy Blood and the Holy Grail (em português: O santo Graal e a Linhagem Sagrada), mas também à lenda oral, esta  simples subida de uma colina francesa rapidamente adquire a sensação de uma iniciação.  Mas o lugar, onde os visitantes geralmente param, é muito prosaico.

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A pequena vila de Rennes-le-Château situa-se no departamento do Languedoc, conhecido por Aude, próximo da cidade de Limoux

A estrada de acesso  conduz inevitavelmente ao solitário parque de estacionamento, através de uma estreita  «grand rue», onde não existe nenhuma estação dos correios nem mesmo uma loja que  vende de tudo – mas que exibe uma livraria esotérica, um bar-restaurante, o castelo em  ruínas, que dá o nome à aldeia, e ruas estreitas que conduzem à famosa igrejinha e ao presbitério.

Este lugar tem uma história sinistra e uma reputação ainda mais sombria, embora um tanto  vaga. Em resumo, segundo a lenda, François Bèrenger Saunière (1852-1917), um vulgar  sacerdote, nascido e criado na aldeia de Montazels, apenas a três quilômetros de Rennes-le- Château, fez uma descoberta de certa natureza durante as obras de renovação da sua delapidada igreja paroquial do século X, exatamente há cem anos. Em resultado dessa  descoberta – ou devido ao seu valor intrínseco ou porque o conduziu a algo que podia ser transformado em vantagem financeira -, ele tornou-se imensamente rico.

A especulação tem variado, ao longo dos anos, quanto à verdadeira natureza da descoberta  de Saunière: muito prosaicamente, tem sido sugerido que ele encontrou uma horda de  tesouros, enquanto outros acreditam que foi alguma coisa muito mais assombrosa, como a  Arca da Aliança, o tesouro do Templo de Jerusalém, o Santo Graal – ou mesmo o túmulo de  Cristo, uma ideia que encontrou a sua mais recente expressão em The Tomb of God de  Richard Andrews e Paul Schellenberger (1996). (Para a nossa discussão da teoria destes autores, consultar o II Apêndice).

Tivemos de ir a Rennes-le-Château porque, segundo os Dossiers secrets e o livro The Holy Blood  and the Holy Grail, o lugar tem particular importância para o Priorado de Sião – embora a  razão exata dessa importância permanecesse obscura. O Priorado afirma que Saunière  descobriu pergaminhos, contendo informação genealógica que prova a sobrevivência da  dinastia merovíngia (descendente de Jesus e Madalena), e afirma que certos indivíduos têm direito a reclamar o trono da  França – tal como Pierre Plantard de Saint-Clair. Contudo, ninguém à margem do Priorado  viu, de fato, esses pergaminhos, e toda a ideia da continuidade da dinastia merovíngia é dúbia, para não dizer mais, e há poucas razões para atribuir grande importância a esta  pretensão de uma herança messiânica para o trono da França.

Há ainda outra importante falha, uma inconsistência flagrante, na história do Priorado. Se  eles existiram realmente, durante tantos séculos, unicamente para proteger os descendentes  merovíngios, é curioso que tenham acolhido bem a informação que lhes indicava quem  eram esses descendentes. Seguramente, eles conheciam aqueles que tinham jurado proteger  – caso contrário, dificilmente teriam o tipo de zelo fanático que, ao longo dos séculos,  mantivera a sua organização durante tanto tempo! Depender – aparentemente – do que é essencialmente uma raison d’être retrospectiva é suspeito, para dizer o mínimo.

Contudo, ficamos intrigados pela importância investida na aldeia pelo Priorado. Há duas  razões possíveis para isso: uma é que a aldeia é, na verdade, importante, mas não pelas  razões apresentadas nos Dossiers – a outra é que a história do padre Saunière não tem qualquer  verdadeira relação com o Priorado e que este se apoderou do mistério para servir os seus  propósitos. Tínhamos de descobrir qual destas alternativas estava mais próxima da verdade.

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A comuna de Rennes Le Chateau com a Torre Magdala ao centro

Chegando ao parque de estacionamento da aldeia, somos confrontados com uma vista  espantosa dos picos dos Pireneus, coroados de neve, para lá do Vale do rio Aude. É fácil  compreender a razão por que, no passado, esta aldeola, aparentemente insignificante, era considerada de grande importância estratégica, porque, certamente, a observação de  quaisquer aproximações inimigas teria sido difícil de igualar.

É esta a razão por que  Rennes-le-Château foi outrora, uma importante fortaleza para os reis Visigodos: alguns vão a ponto de a identificar com a cidade perdida de Rhedae, que era semelhante a Carcassonne e Narbonne –  embora seja difícil imaginar uma cidade tão movimentada no atual aglomerado de casas, particularmente deserto. Mas o lugar ainda exerce uma influência magnética: menos de cem  pessoas vivem agora em Rennes-le-Château, mas a aldeia recebe mais de 25 000 visitantes  por ano.

A torre do reservatório de água, que emerge do próprio parque de estacionamento, ostenta  os signos do Zodíaco – um tema que se repete acima das portas de algumas das pequenas  casas. Mas todos os olhos se voltam para o bizarro edifício, semelhante a um pavilhão, que  parece erguer-se da extremidade rochosa da aldeia, suspenso sobre o precipício. O edifício era a biblioteca e o gabinete de trabalho particular de Saunière, conhecido por Tour  Magdala (a Torre de Magdala). Faz parte do seu domaine, recentemente aberto ao público.  Semelhante a um pequeno torreão medieval, de um lado, a torre dá para os extensos  baluartes que conduzem à estufa agora abandonada.

Nas salas situadas abaixo dos  baluartes, existe agora um museu, dedicado à vida de Saunière e ao mistério que o rodeia.  Um jardim separa a torre da imponente casa que ele mandou construir com a sua riqueza  inexplicável, a Vila Betânia; algumas das suas salas estão abertas ao público. Do outro  lado, junto de um caminho de saibro, encontra-se uma pequena gruta, construída pelo  próprio sacerdote com pedras trazidas especialmente de um vale vizinho e,  presumivelmente, com grande esforço. Depois, chega-se ao cemitério da aldeia e à  delapidada igreja. Esta é dedicada a Santa Maria Madalena.

Dada a fama da igreja, é espantoso verificar que ela é tão pequena, mas qualquer decepção  é compensada pelo carácter bizarro e justamente famoso da decoração interna feita pelo abade  Saunière. Nesta, pelo menos, o abade ainda consegue surpreender. Sobre o pórtico, com os seus quase ridículos pássaros de estuque branco, de segunda  qualidade, e com as telhas amarelas quebradas, estão gravadas as palavras:

Terribilis est locus iste («Este é um lugar terrível»),

uma citação do Livro do Gênesis (28:17) completada em latim sobre o arco do pórtico: «É a casa de Deus e a Porta do Céu.»

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A Tour Magdala (a Torre de Magdala) em Rennes Le Chateau

Uma estátua de  Maria Madalena ocupa um lugar de relevo sobre a porta, enquanto o espaço entre as cornijas está decorado com triângulos equiláteros e esculturas de rosas com uma cruz. Mas  muito mais surpreendente é a visão de um demônio em estuque, horrivelmente contorcido,  parecendo guardar a porta, do lado interior do pórtico. Com chifres e caricato, inclina-se de  modo significativo enquanto carrega sobre os ombros a pia da água benta. Esta é encimada por quatro anjos,  cada um deles fazendo um dos gestos implicados no sinal da cruz, enquanto, por debaixo  deles, estão inscritas as palavras:

Par ce signe tu le vaincras («Por este sinal tu o vencerás»).  

Na parede do fundo vê-se um quadro que representa o batismo de Jesus – que está  representado numa posição que é exatamente a imagem refletida do Demônio. Tanto o  Demônio como Jesus olham para uma parte específica do pavimento, desenhado como um  tabuleiro de xadrez. No quadro, João Baptista eleva-se acima de Jesus, derramando sobre  ele a água de uma concha, repetindo, assim, o tema da pia da água benta, em forma de  concha, que está colocada sobre o Diabo. É evidente que se encontra algum paralelo entre  os dois conjuntos de imagens, entre o Demônio e o batismo de Jesus. (Em Abril de 1996, num dos muitos atos de vandalismo a que a igreja está sujeita, a cabeça do Demônio foi cortada – e roubada – por um atacante desconhecido.)

Cobrindo este pavimento, exitem os quadrados brancos e pretos, e olhando em redor desta pequena igreja paroquial de Santa Maria Madalena, ela parece, à primeira vista, bastante típica da  sua época e lugar. Excessivamente ornamentada com vistosos santos de estuque – como St.º  Antonio, o Eremita e St. Roche -, ela contém a quota habitual de ornamentos eclesiásticos.  Mas estes merecem um escrutínio mais cuidadoso, porque a maioria deles tem um toque, no  mínimo, idiossincrático. Por exemplo, as estações da Via Sacra, invulgarmente, prosseguem em sentido contrário ao dos ponteiros do relógio e incluem um rapaz, que  enverga um saiote escocês, e uma pequena criança negra. E o dossel que encima o púlpito  tem a forma do Templo de Salomão.

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O baixo-relevo do frontal do altar era, dizem, o orgulho e a alegria de Saunière: ele próprio  lhe dera os últimos retoques. Representa uma Madalena revestida de ouro, de joelhos, em  oração, com um livro aberto à sua frente e uma caveira sobre os joelhos. Os dedos estão curiosamente entrelaçados, do modo que é geralmente descrito como latté.

Uma cruz,  aparentemente feita de uma delgada árvore verde – com um rebento a meio da haste – ergue- se em frente dela, e para além da gruta rochosa, onde está ajoelhada, vê-se a forma nítida de edifícios recortados contra a linha do horizonte. Curiosamente, embora o livro e a caveira sejam elementos tradicionais da iconografia de Madalena, o usual vaso de unguento de  nardo não se vê aqui.

Ela também surge nos vitrais, por cima do altar, onde é representada ajoelhada junto de  uma mesa, para ungir os pés de Jesus com o precioso unguento. Ao todo, há quatro imagens  de Madalena nesta igreja, o que, apesar da sua condição de santa padroeira, podia parecer excessivo para um edifício tão pequeno. O comprometimento de Saunière com ela é  reforçado pela designação da sua biblioteca – a Torre de Magdala – e da sua casa – a Vila  Betânia. Betânia era a residência bíblica da família que incluía Lázaro, Marta e Maria.

Há um quarto secreto, oculto por detrás de um armário da sacristia, mas este raramente é  visitado pelo público. A sua única janela, que não se distingue claramente do exterior,  parece representar, nos vitrais, a habitual cena da crucificação. Mas, como virtualmente  tudo o mais neste «terrível lugar», esta cena não é exatamente o que parece (assim como tudo o mais). O olhar é  atraído para a paisagem distante, que se avista sob os braços do homem crucificado;  claramente, é ela o verdadeiro foco do quadro. Mais uma vez, ali está o Templo de  Salomão.

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O padre Saunière em pé ao lado do Pilar do Altar com a imagem de Maria Madalena colocado de cabeça para baixo no jardim da igreja

Mesmo a entrada para o cemitério é invulgar: a arcada está decorada com uma caveira e  dois ossos metálicos cruzados, um emblema dos Cavaleiros Templários – embora o toque  bizarro seja dado pelo esgar que descobre vinte e dois dentes. As sepulturas, ornamentadas  com complicados tributos florais e fotografias dos falecidos, como em tantos outros  cemitérios franceses, incluem as da família Bonhommes. Em qualquer outro lugar, talvez  isto não provocasse comentários mas aqui esta evocação linguística dos cátaros – Les  Bonhommes – parece particularmente pungente. A sepultura de Saunière, com o seu perfil  em baixo-relevo – levemente danificado pelo vandalismo dos tempos recentes – está situada  junto à parede que separa o cemitério do seu antigo domaine. Marie Dénarnaud, sua fiel governanta (se não bastante mais do que isso), está enterrada a seu lado.

Não é nosso objetivo rever, em pormenor, o que se transformou numa história banal. Mas,  ao suspeitar de que o mistério de Rennes le Chateau podia fornecer algumas pistas sobre a continuação  da tradição secreta, não estávamos enganados nem ficamos decepcionados. Como vimos,  encontramos provas de uma complicada série de ligações que remontavam a uma tradição  gnóstica da região, uma zona que foi sempre famosa pelos seus heréticos, sejam eles  cátaros, Templários ou as chamadas «bruxas». Desde o trauma da Cruzada dos Albigenses (perseguição pela igreja romana ao movimento gnóstico dos Cátaros), os habitantes locais nunca mais confiaram totalmente no Vaticano, de modo que, a região  constituiu o refúgio perfeito para ideias heterodoxas e também para aqueles que tinham  interesses políticos minoritários. No Languedoc, com as suas longas e amargas memórias, a  heresia e a política andaram sempre de mão dada, como talvez ainda andem.

Em Saunière, encontramos um sacerdote extrovertido e rebelde. Dificilmente podia ser  considerado um típico pároco de aldeia, conhecia bem o grego e o latim e foi um assinante  regular de um jornal alemão contemporâneo. Se ele descobriu, ou não, um tesouro ou um segredo, e improvável que todo o «caso Rennes» seja uma completa invenção. Há, no entanto, várias razões para pensar que a  história, tal como é contada, foi muito mal interpretada ou muito mal “entendida”.

A sequência exata dos acontecimentos é notavelmente difícil de reconstituir, porque ela se  apoia mais nas memórias dos aldeões do que em provas documentais. Saunière aceitou o  seu cargo de pároco no princípio de Junho de 1885. Passados alguns meses, teve problemas  por ter pregado do seu púlpito um veemente sermão anti-republicano (durante as eleições  francesas daquele ano) e foi temporariamente suspenso do seu cargo. Reintegrado no Verão de 1886,  recebeu uma doação de $ 300 francos, feita pela condessa de Chámbord, viúva de um pretendente ao trono francês – Henri de Bourbon, que reclamava o título de Henrique V -, em  reconhecimento dos serviços prestados à causa monárquica.

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Pilar visigótico original do Altar com o orifício onde foram encontrados os pergaminhos, que agora reside no Museu Saunière em Rennes-le-Chateau

Aparentemente, Saunière usou  o dinheiro para recuperar a sua antiga igreja e, segundo a maioria dos relatos, foi então que  o pilar visigótico, que sustentava o altar, foi removido – dentro do qual, segundo se diz, ele  encontrou certos pergaminhos com segredos codificados. Mas isto parece pouco provável, porque o seu comportamento excêntrico e projetos ambiciosos apenas começaram em 1891. Foi nessa altura que o sineiro, Antoine Captier, encontrou uma coisa importante. Segundo alguns era  um cilindro de madeira, enquanto outros afirmam que era um frasco de vidro: fosse o que  fosse, julga-se que ele continha um rolo de pergaminhos ou de documentos, que ele  entregou a Saunière. E parece ter sido esta descoberta que deu origem aos atos peculiares do sacerdote e sua consequente e posterior riqueza.

Segundo a versão usual, Saunière apresentou os pergaminhos ao bispo de Carcassonne,  Félix-Arsène Billard, o que precipitou uma viagem a Paris. Dizem que Saunière fora  aconselhado a mandar descodificar os documentos por um perito, Émile Hoffet, então um  rapaz que se preparava para o sacerdócio, mas já possuía um conhecimento profundo do  ocultismo e do mundo das sociedades secretas. (Mais tarde, ensinou na igreja de Notre-Dame de Lumières, em Goult, um lugar da Madona Negra, especialmente importante para o  Priorado de Sião.) O tio de Hoffet era diretor do seminário de Saint-Sulpice de Paris.

A igreja de St. Sulpice distingue-se pelo fato de o meridiano de Paris – que passa próximo  de Rennes-le-Château – estar marcado por uma linha de cobre traçada sobre o pavimento.  Construída sobre os alicerces de um antigo templo de ÍSIS, em 1645, foi fundada por Jean-Jacques  Olier, que a mandou desenhar segundo o Meio Termo Ideal da geometria sagrada. Recebeu  o nome de um bispo de Bourges, da época do rei merovíngio Dagobert II, e a sua  festividade é comemorada a 17 de Janeiro – uma data recorrente dos mistérios de Rennes-le-Château e do Priorado de Sião.

Grande parte do romance satânico de J. K.  Hysmans Là-Bas decorre em St. Sulpice, e o seminário, que lhe é anexo, foi notório pela heterodoxia (para dizer o mínimo) do final do século XIX. Também serviu de quartel-general à misteriosa sociedade secreta do século XVII denominada Companhia do Santo  Sacramento que, segundo tem sido sugerido, servia de fachada ao Priorado de Sião.

Durante a estada de Saunière em Paris – que aconteceu no Verão de 1891 ou na Primavera  de 1892 – Hoffet introduziu-o na florescente sociedade ocultista, centrada em Emma Calvé  e que incluía figuras como Joséphin Péladan, Stanislas de Guaïta, Jules Bois e Papas  (Encausse). Segundo um rumor persistente, Saunière e Emma tornaram-se  amantes. Diz-se que Saunière visitou a igreja de Saint Surpice e estudou algumas das suas pinturas e  – de acordo com a história habitual – comprou reproduções de pinturas específicas no  Louvre (que serão discutidas mais tarde). Depois de regressar a Rennes-le-Château,  começou a decoração da sua igreja e a construção do seu domaine.

A visita a Paris é uma parte crucial do mistério de Saunière e tem sido sempre objeto de  intenso escrutínio por parte dos investigadores. Não há prova direta de que ela tivesse acontecido. Uma fotografia de Saunière, que ostenta o nome de um estúdio de Paris,  durante muito tempo tomada como prova da viagem, revelou, recentemente, ser uma  fotografia do irmão mais novo, Alfred (também sacerdote). Também foi afirmado que a  assinatura de Saunière surge no livro das missas, em Saint-Sulpice, mas isso nunca foi  confirmado.

O escritor Gérard de Sède, que possuiu alguns dos documentos de Émile  Hoffet, afirma que eles contêm uma nota de um encontro com Saunière, em Paris (sem  data, infelizmente), mas, tanto quanto sabemos, não há corroboração independente desse  encontro. Como grande parte desta história, ele assenta nas memórias e testemunhos dos  aldeões e de outras pessoas. Por exemplo, Claire Captier, filha de Corbu, o homem que  comprou a Marie Dénarnaud o domaine de Saunière, em 1916 – esta continuou a viver com os Corbu até à sua morte, em 1953 -, afirma categoricamente que a viagem a Paris se  realizou.

O que Saunière encontrou parece tê-lo tornado extrema e rapidamente rico. Quando  assumiu o seu cargo, o seu estipêndio era de $ 75 francos por mês. Contudo, entre 1896 e a  sua morte, em 1917, ele gastou uma larga soma de dinheiro – talvez não os $ 23 milhões de  francos, que alguns pretendem, mas, certamente, não menos de $ 160 mil francos por mês.  Tinha contas bancárias em Paris, Perpignan, Toulouse e Budapeste e investiu fortemente  em ações e títulos do Estado – não era a habitual situação financeira de um sacerdote da província.

Alega-se que ele ganhou o dinheiro com o tráfico de missas (cobrando para celebrar missas que, supostamente, perdoavam ao pagador vários anos de Purgatório), mas, embora ele certamente procedesse deste modo, como afirma o historiador  francês René Descadeillas – considerado o principal critico do caso Saunière -, isso não  podia ter «rendido somas suficientes para lhe permitir edificar essas construções e, ao  mesmo tempo, viver tão luxuosamente. Por conseguinte, havia qualquer coisa mais». Em qualquer caso, poder-se-ia perguntar por que razão tantas pessoas teriam desejado que  as missas fossem celebradas por Saunière – um insignificante sacerdote rural de uma  paróquia remota.

Ele e Maria provocaram criticas devido à sua luxuosa maneira de viver: ela vestia sempre  as últimas modas de Paris (diz-se que foi essa a razão da sua alcunha de «La Madonne», e  ofereciam recepções, em escala completamente desproporcionada com o seu rendimento ou  posição social. Além disso, os ricos e famosos faziam a viagem, incrivelmente difícil, para  Rennes-le-Château para os visitar. (Por alguma estranha razão, no entanto, Saunière apenas  recebia visitas na Vila Betânia, preferindo viver no velho presbitério anexo à igreja.) Os visitantes incluíram um príncipe de Habsburgo – que tinha o nome, curiosamente sugestivo,  de Johann Salvator von Habsgurg – um ministro do Governo e Emma Calvé.

Mas não foi apenas o fausto da sua hospitalidade que provocou hostilidade: Saunière e  Marie começaram a cavar no cemitério durante a noite. Embora, de modo geral, o que eles  procuravam fosse matéria para especulação, é certo que eles apagaram as inscrições da  pedra vertical e da placa que cobria a sepultura que ostentava o sugestivo nome de Marie de  Nègre d’Ables – uma mulher nobre da região, falecida a 17 de Janeiro de 1781 -,  presumivelmente para destruir a informação que ela continha. Mas eles não sabiam que  todo este esforço era inútil – já existia uma cópia da inscrição graças a visitantes, membros  de uma sociedade de antiquários locais. Mas, como veremos, a ansiedade de Saunière de destruir a inscrição tem grande importância para a nossa investigação.

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Um poço (uma cripta) que fica abaixo da igreja de Rennes-le-Château – Diário de Rennes-le-Château ©

Na época da alegada viagem a Paris, Saunière também encontrou a «Pedra do Cavaleiro»,  mas voltada para baixo, junto do altar, uma laje gravada, datando da época do reino visigodo e que representa um cavaleiro acompanhado por uma criança. Parecia que ele tinha encontrado alguma coisa de grande importância – talvez outro esconderijo de documentos ou artefatos  ou a entrada para uma cripta. Ninguém sabe, ao certo, porque Saunière mandou substituir o  pavimento, mas o seu diário apresenta o enigmático registo, a 23 de Setembro de 1891:  «Carta de Granès. Descoberta de um túmulo. Choveu.» 

As escavações noturnas de Saunière provocaram um escândalo local, mas foi o seu tráfico de missas que, eventualmente, despertou a ira das autoridades da Igreja, a ponto dele ser privado do seu cargo eclesiástico. Foi mesmo transferido para outra  paróquia, mas recusou categoricamente em obedecer, e continuou a viver em Rennes-le-Château com Marie. Quando a Igreja enviou outro sacerdote para a aldeia, Saunière celebrava missa, sem caráter oficial, para os aldeões, que se lhe mantinham fiéis.

De todos os mistérios que rodearam Saunière, talvez um dos mais persistentes seja aquele  que se seguiu à sua morte. Adoeceu a 17 de Janeiro de 1917; morreu cinco dias depois e o  seu corpo foi colocado numa cadeira, sentado direito, nos baluartes do terraço do seu domaine,  enquanto os aldeões – e outros, que já tinham feito viagens mais longas – desfilavam,  arrancando pompons vermelhos do seu manto. A sua última confissão foi ouvida pelo  sacerdote da vizinha aldeia de Espéraza, e o que foi dito teve nele um efeito tão profundo,  que René Descadeillas afirma: «[… ] a partir desse dia, o velho sacerdote nunca mais foi o mesmo homem; era evidente que ele recebera um choque» com a confissão de Sauniere.

Depois da sua morte, a fiel Marie Dénarnaud continou a viver na Vila Betânia. Saunière,  que, como sacerdote, não podia possuir bens, comprara todas as terras em nome dela. Marie  tornou-se cada vez mais solitária e ganhou fama de irascível, resistindo às múltiplas  tentativas para a convencer a vender o domaine, cada vez mais abandonado. Finalmente,  em 1946, no dia da festividade de Maria Madalena, ela vendeu-o a Noël Corbu, um  homem de negócios, na condição de poder lá viver o resto dos seus dias.

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Interior da igreja dedicada a Maria Madalena em Rennes Le Chateau [Estivemos no local...]

A filha de Corbu, Claire Captier, recorda-se de viver lá quando era criança. Segundo Claire,  Marie visitava a sepultura de  Saunière todos os dias – e a meio de todas as noites. Marie  relatou à jovem Claire um fenômeno que acompanhava algumas dessas visitas. Costumava  dizer: «Esta noite, fui seguida pelos fogos-fátuos do cemitério». Quando lhe perguntavam  se tinha medo, Marie respondia: «Estou habituada… Se caminho lentamente, eles seguem-me… quando paro, eles também param, e quando fecho o portão do cemitério, desaparecem sempre.» Claire Captier também recorda que Marie dizia: «Com o que Monsieur le Curé (Sauniere) deixou,  podia alimentar toda a Rennes durante cem anos, e ainda sobraria.»

E, quando lhe  perguntavam por que vivia como pobre, se tinha herdado tanto dinheiro, ela respondia: «Não lhe posso tocar.» Em 1949, quando soube que o negócio de Corbu corria mal, Marie disse-lhe: «Não se preocupe tanto, meu caro Noël… um dia, revelar-lhe-ei um segredo que  fará de si um homem rico… muito rico!» Infelizmente, nos meses que precederam a sua  morte, provocada por um ataque súbito, em Janeiro de 1953, ela tornou-se senil, e o  segredo morreu com ela.

A que dizia respeito a história de Saunière? Certamente, parece que ele estava sendo muito bem  pago por um agente exterior para continuar a viver na aldeia (mesmo quando já era rico e já  não era pároco, ele preferiu continuar lá residindo), embora os pagamentos pareçam ter sido  irregulares. A sua riqueza não consistia numa grande quantia, recebida de uma só vez,  como alguns sugeriram, porque a sua liquidez monetária era variável. Por vezes, passava  por períodos de carência, mas retomava a sua vida luxuosa numa questão de meses.

Na  época da sua morte, estava empenhado em novos e ambiciosos projetos, que custariam, no  mínimo, mais $ 8 milhões de francos – construir uma boa estrada de acesso à aldeia, para o  automóvel que tencionava comprar, canalizar água para todas as casas, criar uma pia  batismal exterior e erigir uma torre com setenta metros de altura, da qual tencionava  chamar os fiéis à oração.

Fortes candidatos ao papel de pagador são os monarquistas, mas, nesse caso, há um mistério  diferente. Que possíveis serviços poderia Saunière ter-lhes prestado que resultassem em  pagamentos em tão grande escala? Podia a sua obsessão com Madalena sugerir, de algum  modo, a razão subjacente às generosas recompensas dos monarquistas? Certamente que a  sua riqueza significava mais do que um envolvimento numa intriga política. E os seus  poucos livros de memórias, nas palavras de Gérard de Sède, revelam:

Uma curiosa devoção à Bona Dea, ao princípio divino do eterno feminino, que, na boca de  Béranger [Saunière], parece transcender a crença e a fé. 

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Maat e ÍSIS

Mais uma vez, encontramos segredos que rodeiam o Princípio Feminino Divino, personificados em Maria Madalena… e uma clara ligação com o Priorado de Sião, que declara venerar as  Madonas Negras e ÍSIS. E, como veremos, a área circundante de Rennes-le-Château contém  múltiplas pistas da continuação desta forma de culto da deusa, do culto ao Princípio Feminino Divino.

E quanto aos famosos pergaminhos, supostamente encontrados por Saunière (segundo as  fontes do Priorado)? Dizem que consistiam em duas genealogias, relativas à sobrevivência  da dinastia merovíngia, e em dois extratos dos Evangelhos, nos quais certas letras, que  estão destacadas, transmitem mensagens codificadas. Os pergaminhos nunca foram  tornados públicos, mas alegadas cópias dos textos codificados foram largamente  publicados, surgindo, pela primeira vez, em 1967, em L’or de Rennes de Gérard Séde e de sua mulher, Sophie. (De fato, embora ele não seja considerado como tal, Pierre Plantard da Saint-Claire declarou que fora co-autor deste livro.)

Estes textos foram tema de milhares de palavras e de constante especulação. A partir do  relato do Novo Testamento, acerca de Jesus e dos discípulos na seara, ao sábado, as letras  destacadas, quando lidas por ordem, formam as seguintes palavras:

A DAGOBERT II ROI ET A SION EST CE TRESOR ET IL EST LA MORT 

PARA DAGOBERTO II REI E PARA SIÃO É ESTE TESOURO E ELE É A MORTE 

O outro texto descreve, de forma evidente, a unção de Jesus por Maria de (Madalena) Betânia, e a  versão descodificada é apresentada como:

BERGÈRE PAS DE TENTATION QUE POUSSIN TENIERS GARDENT LA CLEF PAX  681 PAR LA CROIX ET CE CHEVAL DE DIEU J’ACHEVE CE DAEMON DE  GUARDIEN A MIDI POMMES BLEUS 

PASTORA NADA DE TENTAÇÃO QUE POUSSIN TENIERS GUARDA A CHAVE  PAZ 681 PELA CRUZ E ESTE CAVALO DE DEUS EU COMPLETO [OU MATO] ESTE DEMÔNIO GUARDIÃO AO MEIO-DIA [OU NO SUL] MAÇÃS AZUIS 

A decifração deste código foi muito mais complexa do que a primeira frase. Pela leitura das  letras destacadas neste caso, obtemos «REX MUNDI» «Rei do Mundo», em latim – uma  designação gnóstica do rei deste mundo, que foi usada pelos cátaros), mas também foram  acrescentadas 140 letras estranhas, tornando muito tortuoso o processo de descodificação  para obter a mensagem «Pastora nada de tentação». (Curiosamente, este sistema fora  criado pelo alquimista francês Blaise de Vignière, que fora secretário de Lorenzo de  Medici.) A mensagem final é um perfeito anagrama da inscrição da pedra tumular de Marie de Nègre (que será discutida no capítulo seguinte).

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Maat, um dos princípios criadores divinos do feminino sagrado

Embora haja poucas dúvidas de que a descodificação da mensagem seja exata, tem havido  muitas tentativas engenhosas – e muito imaginativas – para a explicar ou para a compreender.  Nenhuma delas foi completamente satisfatória. (A mais recente, de Andrews e de Schellenberger, é discutida no I Apêndice.)

O problema destes pergaminhos é que Philippe Chérisey, associado de Pierre Plantard de  Saint-Claire (e seu provável sucessor, como grão-mestre do Priorado de Sião, em 1984),  admitiu, mais tarde, que os forjara, nos anos 60. (Quando confrontado com a confissão  de Chérisey, pelos autores de The Holy Blood and The Holy Grail, Plantard alegou que Chérisey simplesmente os copiara, o que não é inteiramente  convincente.)

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Seja qual for a maneira de se considerar estes pergaminhos, tem de se admitir que eles têm grande  êxito como passatempo clássico e que são demasiado duvidosos para apresentar diretrizes  importantes para uma investigação da história de Saunière.

Continua ...


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