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As Digitais dos deuses: (16) O Santuário da Serpente 

Saindo de Cholula, viajamos para leste, passando pelas prósperas cidades de Puebla, Orizaba e Córdoba, a caminho de Veracruz e do golfo do México. Cruzamos os picos cobertos pela névoa da Sierra Madre Oriental, onde o ar era frio e rarefeito, e descemos em seguida para o nível do mar e para planícies cobertas de plantações luxuriantes de palmeiras e bananeiras. Estávamos penetrando no coração da civilização mais antiga e mais misteriosa do México, a dos chamados olmecas, cujo nome significa “povo da borracha”. Datando do segundo milênio a.C., os olmecas se extinguiram cerca de 1.500 anos antes da ascensão do império asteca.


Livro “AS DIGITAIS dos DEUSES“, uma resposta para o mistério das origens e do fim da civilização, por Graham Hancock – Tradução de Ruy Jungmann, editora Record 2001.

CAPÍTULO 16 – O Santuário da Serpente 

Os astecas, no entanto, haviam preservado intrigantes tradições relativas a esse povo e eram mesmo responsáveis por lhes dar nome, numa referência à área produtora de borracha da costa do Golfo, onde se acredita que tivessem vivido. Essa área se situa entre a moderna Veracruz, a oeste, e Ciudad del Carmen, a leste. Nessa zona, os astecas encontraram grande número de objetos rituais antigos, produzidos pelos olmecas e, por motivos desconhecidos, conservaram-nos e deram-lhes posição de destaque em seus próprios templos.

Coatzacoalcos, “Santuário da Serpente”

No mapa que eu usava, a linha azul do rio Coatzecoalcos penetrava no golfo do México mais ou menos no ponto central da lendária terra ancestral dos olmecas. Atualmente, no local onde antes havia seringueiras, prospera a indústria do petróleo, transformando um paraíso tropical em alguma coisa que lembra o círculo mais baixo do Inferno de Dante. Desde o grande surto da exploração de petróleo em 1973, a cidade de Coatzecoalcos, outrora agradável e hospitaleira, embora relativamente pobre, floresceu e transformou-se em centro de transporte e refino de petróleo, com hotéis dotados de ar condicionado e uma população de meio milhão de almas.

O local se situa perto do coração negro de uma terra industrializada devastada, na qual virtualmente tudo de interesse arqueológico que escapou das depredações dos espanhóis no tempo da conquista foi destruído pela expansão voraz da indústria petrolífera. Não era mais possível, portanto, na base de prova robusta, confirmar ou negar a sugestão intrigante aparentemente transmitida pelas lendas: que alguma coisa de grande importância deve ter acontecido nessa área. Lembrei-me que Coatzecoalcos significa “Santuário da Serpente”.

Aqui, na remota antiguidade, Quetzalcoatl e seus companheiros teriam desembarcado ao chegar ao México, vindos do outro lado do mar, em barcos cujos “costados brilhavam como escamas de pele de serpente”. E fora daqui que se acreditava que ele viajou (em uma jangada de serpentes), quando deixou a América Central. O Santuário da Serpente, além disso, estava começando a parecer como o nome da terra olmeca, que incluíra não só Coatzecoalcos, mas vários outros sítios situados em áreas menos assoladas pelo desenvolvimento econômico.

Inicialmente em Tres Zapotes, a oeste de Coatzecoalcos, e em seguida em San Lorenzo e La Venta, a sul e a leste, numerosas peças de escultura caracteristicamente olmecas haviam sido desenterradas. Eram, sem exceção, monólitos talhados em basalto ou em materiais analogamente duráveis. Alguns tinham a forma de cabeças gigantescas, que pesavam até 30 toneladas. Outras eram estelas maciças, gravadas com cenas de encontros que envolviam aparentemente duas raças distintas da humanidade, nenhuma delas ameríndia. Quem quer que tivesse produzido essas notáveis obras de arte havia, obviamente, pertencido a uma civilização refinada, bem organizada, próspera e tecnologicamente avançada.

O problema era que nada absolutamente restava dela, exceto as obras de arte, das quais se poderia deduzir o que se quisesse sobre o caráter e origens de tal civilização. Era claro apenas que “os olmecas” (os arqueólogos aceitaram contentes a designação que lhes fora dada pelos astecas) haviam se materializado na América Central por volta do ano 1500 a.C., com uma cultura sofisticada já plenamente desenvolvida.

Santiago Tuxtla

Passamos a noite no porto pesqueiro de Alvarado e continuamos no dia seguinte a viagem para leste. A estrada serpenteava por colinas e vales férteis, dando-nos uma visão ocasional do golfo do México, antes de embicar para o interior. Passamos por prados verdes pontilhados de arbustos carregados de flores vermelhas e amarelas e pequenas aldeias aninhadas em depressões cobertas de relva. Aqui e ali, víamos hortas particulares, onde porcos enormes procuravam comida entre restos de lixo doméstico. Em seguida, chegamos ao alto de uma colina, de onde descortinamos uma paisagem vastíssima de campos e florestas, limitados apenas pelo nevoeiro da manhã e as silhuetas desmaiadas de montanhas distantes.

Alguns quilômetros à frente, descemos para um buraco, em cujo fundo se estendia a velha cidade colonial de Santiago Tuxtla. O local era uma balbúrdia de cores: fachadas espalhafatosas de lojas, telhados vermelhos, chapéus de palha amarelos, coqueiros, bananeiras, crianças vestidas com roupas de cores vivas. De várias lojas e cafés saía música através de alto-falantes. Na Zocalo, a praça principal, fomos envolvidos por ar denso de umidade e o farfalhar de asas e canções de aves tropicais de olhos brilhantes. Um pequeno parque de árvores frondosas ocupava o centro da praça e, no centro do parque, como se fosse um talismã mágico, vimos um enorme calhau cinzento, de quase 3 metros de altura, esculpido na forma de uma cabeça africana coberta por um capacete. Lábios grossos e nariz forte, olhos serenamente fechados e mandíbula inferior repousando solidamente no chão, a cabeça exibia uma sombria e paciente gravidade. 

Ai, então, estava o primeiro mistério dos olmecas: uma peça monumental de escultura, de mais de 2.000 anos de idade, mostrando um sujeito de feições inconfundivelmente negróides. Não havia, claro, negros africanos no Novo Mundo há 1.000 anos e nenhum chegou a estas paragens até começar o tráfico de escravos, muito depois da conquista. Há, contudo, prova paleoantropológica robusta de que uma de muitas migrações diferentes para as Américas, durante a última Era Glacial, consistiu, de fato, de indivíduos de raça negróide. Essa migração teria ocorrido por volta do ano 15000 a.C. Conhecida como a “Cabeça de Cobata”, numa referência ao estado onde foi encontrado, o imenso monólito de Zocalo é a maior de 16 esculturas olmecas semelhantes até agora escavadas no México. Pensa-se que foi esculpida não muito tempo antes da época de Cristo e pesa mais de 30 toneladas.

Tres Zapotes

Deixando Santiago Tuxtla, viajamos 25km na direção sudoeste, passando por campo virgem e luxuriante em direção a Tres Zapotes, um centro olmeca importante mais recente, que se pensa ter florescido entre os anos 500 a.C. e 100 d.C. Atualmente reduzido à condição de uma série de cômoros espalhados através de milharais, o sítio passou por extensos trabalhos de escavação em 1939-40, realizados pelo arqueólogo americano Matthew Stirling. Lembrei-me de que historiadores dogmáticos que estudaram esse período sustentam tenazmente a opinião de que a civilização maia foi a mais antiga da América Central. Pode-se afirmar esse fato com “confiança”, argumentam eles, porque o sistema maia de calendário, composto de pontos e barras (e que foi recentemente decodificado) tornou possível a datação precisa de um número imenso de inscrições cerimoniais.

A data mais antiga jamais encontrada em um sítio maia corresponde ao ano 228 d.C. do calendário cristão. Por isso mesmo, o status quo acadêmico sofreu um rude choque quando  Stirling desenterrou uma estela em Tres Zapotes que revelava uma data anterior. Entalhada no código conhecido de pontos e barras do calendário maia, a peça correspondia ao dia 3 de setembro do ano 32 a.C. O chocante em tudo isso era que Tres Zapotes não era um sítio maia – de nenhuma maneira concebível. Era inteira, exclusiva e inequivocamente olmeca. Esse fato sugeria que os olmecas, e não os maias, deveriam ter sido os inventores do calendário e que eles, e não os maias, deveriam ser reconhecidos como a “cultura-mãe” da América Central.

Estela de Tres Zapotes

A despeito da oposição ferrenha de gangues de maianistas furiosos, surgiu gradualmente a verdade que a pá de Stirling desenterrara em Tres Zapotes. Os olmecas eram muito, muitíssimo mais antigos do que os maias. Tinham sido um povo inteligente, civilizado, tecnologicamente avançado e, de fato, pareciam ter inventado o sistema de pontos e barras da notação do calendário, com a enigmática data inicial de 13 de agosto do ano 3114 a.C., e que previa o fim do mundo no ano 2012 (21 de dezembro) de nossa era. Nas proximidades da estela do calendário, em Três Zapotes, Stirling desenterrou também uma cabeça gigantesca. Nesse momento, eu me encontrava sentado em frente a ela. Datada de cerca do ano 100 a.C., a cabeça mede aproximadamente 1,80m de altura, com 5,48m de circunferência e pesa mais de 10 toneladas.

Tal como sua contrapartida em Santiago Tuxtla, é inconfundivelmente a cabeça de um negro africano, usando capacete bem justo, preso por um longo barbicacho. Os lobos das orelhas são furados e fechados com enfeites. As feições negróides pronunciadas são cortadas por fundas rugas em cada lado do nariz e toda a face projeta-se para a frente, acima de lábios grossos e encurvados para baixo, olhos abertos e vigilantes, amendoados e frios. Por baixo do curioso capacete, as sobrancelhas grossas parecem eriçadas e iradas. Espantado com a descoberta, Stirling comentou-a nas palavras seguintes:

“A cabeça era simplesmente uma cabeça, esculpida em um único bloco maciço de basalto. Repousava sobre uma fundação preparada de lajes brutas de pedra. (…) Uma vez retirada a terra em volta, ela representava um espetáculo digno de admiração. A despeito do grande tamanho, o trabalho artesanal é delicado e seguro e perfeitas as proporções. De caráter excepcional entre esculturas nativas americanas, é notável pelo seu tratamento realístico. As feições são bem nítidas e espantosamente negróides… “

Pouco depois, o arqueólogo americano realizou outra descoberta perturbadora em Tres Zapotes: brinquedos de criança sob a forma de pequenos cães com rodas. Esses interessantes artefatos colidiam de frente com a opinião arqueológica predominante que sustenta que a roda não foi conhecida na América Central até o tempo da conquista. Os “cachorromóveis” provaram, no mínimo, que o princípio da roda era conhecido pelos olmecas, a civilização mais antiga da América Central. E se um povo tão fértil em recursos como os olmecas havia descoberto o princípio da roda, parece improvável que a tenha usado apenas em brinquedos de criança.

Continua . . .


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