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Maria Madalena e o Santo Graal: A Mulher do Vaso de Alabastro (VIII) – A Noiva no Folclore e na Lenda

O cristianismo institucional, que tem alimentado a civilização ocidental há mais de dois mil anos, pode ter sido construído sobre uma gigantesca falha em sua história: a Negação do feminino. Durante muitos anos convivi com uma vaga sensação de que algo estava radicalmente errado com o meu mundo. Sentia que, por um período longo demais, o feminino em nossa cultura vinha sendo desprezado e desvalorizado. Mas foi somente em 1985 que encontrei provas documentais de uma devastadora fratura na história cristã e nos ensinamentos da igreja de Roma. Em abril daquele ano, sabendo do meu grande interesse pelas Escrituras judaico-cristãs e pela origem do cristianismo, uma amiga me indicou o livro The Holy Blood and the Holy Grail”(O Santo Graal e a Linhagem Sagrada).

Livro “Maria Madalena e o Santo Graal: A Mulher do Vaso de Alabastro”, de Margaret Starbird

Livro em PDF: https://pt.scribd.com/ – https://www.escoladaluz.com.br/ 

CAPÍTULO VIII – A Noiva no Folclore e na Lenda

“Até quando vocês, inexperientes, irão contentar-se com a sua inexperiência? Vocês, zombadores, até quando terão prazer na zombaria? E vocês, tolos, até quando desprezarão o conhecimento?” – Provérbios 1:22

Não posso concluir o assunto da heresia sem mencionar um tema recorrente que se relaciona a ela: o da princesa perdida, que aparece com freqüência no folclore europeu. Mas, primeiramente, vamos destacar alguns pontos sobre as tentativas da Igreja de Roma de sufocar a heresia do Graal. No mesmo século que assistiu ao retorno dos cruzados e à irrupção das heresias, a Igreja de Roma fez uma tentativa geral de identificar Nossa Senhora, a Domina, com Maria, a mãe de Jesus. Uma nova celebração de Maria, a Festa da Imaculada Conceição, foi estabelecida em 1140 em Lyon, na região de Provença.

Esse evento estimulou a interpretação de que a Virgem Maria fora concebida de maneira “imaculada” por seus pais (Ana e Joaquim, segundo a tradição da Igreja de Roma), afastando qualquer possibilidade de que fosse vista como um ser humano comum. São Bernardo de Claraval (o criador da regra da Ordem dos Cavaleiros Templários) declarou que a nova festividade era algo que “os costumes da Igreja desconheciam e a razão não comprovava”. Essa doutrina equivocada da Virgem Maria “concebida sem pecado” refletia a visão dogmática predominante, propagada pela Igreja, de que o sexo, mesmo no casamento era, de alguma maneira, pecaminoso.

Podemos nos perguntar como seria o mundo se, em vez disso, tivéssemos aprendido que o sexo é uma expressão sagrada, prazerosa e significativa do amor entre um casal que se ama (um HOMEM  e uma MULHER), o ato que nos transforma em “deuses criadores” de outro ser humano, que gera a vida, como era no jardim do Amado. É interessante observar que, no final da Cruzada Albigense, as filhas sobreviventes dos nobres daquela região foram obrigadas a se casar com descendentes das famílias do Norte do país, que, segundo se dizia, não haviam sido maculadas pela heresia. Como vimos, essa foi uma tentativa de dispersar a linhagem da Videira.

Documentos da Inquisição evitavam mencionar esse aspecto de sua campanha contra os hereges do Sul, preferindo apontar as “doutrinas” e práticas dos cátaros e, mais tarde, dos Templários, como motivo para a perseguição. Mas, como muitos estudiosos modernos acreditam, os hereges albigenses, que aderiam a várias seitas e formas diferentes de persuasão, praticavam uma versão vívida e carismática da fé cristã. São Bernardo de Claraval disse sobre os cátaros de seu tempo que nenhum sermão poderia ser mais completamente cristão do que o deles e que sua moral era pura.

Mesmo assim ( e por isso mesmo), eles foram perseguidos e eliminados por mercenários a serviço do papa de plantão em Roma e pelo rei da França, ajudados pela Inquisição da igreja romana oficialmente formada com esse propósito. A fé dos hereges obscureceu-se pela inacreditável violência com que foi perseguida pelas “autoridades” da ortodoxia. Mas, como estamos vendo com esta leitura, os adeptos da heresia do Graal deixaram um legado na arte e na música que não pode ser ignorado. O povo (os mansos e humildes) tem uma maneira de saber pelo coração. E a crença dos hereges ficou entrelaçada em suas histórias, em numerosas versões, algumas das quais posso citar aqui.

A Noiva Negra

Um dos rios que carregaram as águas da heresia com o passar dos séculos era formado pelos contos de fadas, que compõem o que denominamos folclore. Entre os mais populares estava a história de Cinderela. Existem dois fatos muito significativos sobre essa personagem, que se tornam relevantes para a nossa busca: ela era o “feminino perdido” – maltratada, corrompida e mantida no “exílio” e na obscuridade, relegada à cozinha e aos afazeres domésticos, uma “serviçal”- e seu rosto, como o nome sugere, era coberto de fuligem (cinde e cendre equivalem a “cinzas”). Na verdade, ela era um eco da Madona Negra.

A serviçal de rosto negro ou coberto de cinzas nos traz à memória a noiva de tez escura do livro de Salomão, queimada de sol em decorrência do trabalho nos vinhedos de seu irmão (Cântico dos Cânticos 1:6). Ela também nos lembra Sara, a criança de pele morena que estava no barco com Maria Madalena e sua família. Cinderela é chamada Aschenputtel em alemão (asche que dizer “cinza”), outro reflexo das palavras do Livro das Lamentações que pranteiam o destino de Jerusalém e da filha de Sião:

“Os que se criavam em escarlate abraçam montes de cinzas” (Lamentações 4:5).

Cinderela, a princesa perdida cujo rosto era coberto de cinzas, finalmente se torna capaz de cumprir o seu destino como noiva do príncipe, com a ajuda de passarinhos e ratos (os simples elementos da natureza vêm em seu socorro!), e todas as pessoas do reino vivem felizes para sempre. O casamento invariavelmente cura a terra devastada nos contos de fadas europeus. As (ignorantes) feministas modernas viraram essa lenda de cabeça para baixo. Desprezando a insinuação de que uma mulher precisa do homem (assim como o homem precisa da mulher para se completar) para ser completa, elas não perceberam o ponto principal subjetivo da história: o de que é o príncipe que busca, com amor verdadeiro, a sua parceira divina perdida.

O tema da “negritude” da princesa perdida mencionado em capítulos anteriores – e sua identidade como Noiva-Irmã negra e filha de Sião – é importante demais para deixar de ser analisado com certa profundidade. Ele está refletido nos santuários da Madona Negra, na Europa, alguns dos quais contêm estátuas extremamente antigas. Acredita-se que a Nossa Senhora de Rocamadour, uma estátua que fica perto de Toulouse, no coração da região albigense, tenha sido visitada por Carlos Magno no século IX. Feita de cedro, suas mãos e seu rosto foram pintados de preto.

Outras estátuas da Madona Negra incluem Nossa Senhora de Valcourt (século X); Nossa Senhora de Myans, padroeira de Savoy (uma escultura com data anterior ao século XII); Nossa Senhora de Montserrat (século XII); Nossa Senhora de La Sarte (século XIII); e a Nossa Senhora da galeria subterrânea da Catedral de Chartres. Todas essas representações da Madona Negra parecem anteceder o poder da Inquisição. Uma segunda estátua popular da Madona Negra está em Chartres.

Lembrando da discussão sobre Boaz – a coluna esquerda quebrada do Templo de Salomão em Jerusalém -, parece mais do que uma simples coincidência o fato de que essa Madona Negra seja chamada de Nossa Senhora do Pilar. É claro que a razão óbvia é o fato de ela estar sobre um pilar. Mas alguém deve ter escolhido esse local específico para colocá-la. Seria mais uma referência oculta à outra Maria, a viúva de Jesus? Uma das Madonas Negras mais famosas é o ícone de Nossa Senhora de Czestochowa, a padroeira da Polônia, a quem o Papa João Paulo II prestava especial devoção. Credita-se a ela o fato de ter protegido a nação polonesa da destruição causada pelos exércitos de Gustavo Adolfo durante a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648).

Talvez uma geração futura lhe atribua o mérito de ter libertado a Europa Oriental do domínio soviético e do comunismo! A lenda diz que esse ícone de Nossa Senhora foi levado do Império Bizantino para a Polônia no século X. Curiosamente, o lado esquerdo do rosto da Madona apresenta um talho. Ela não apenas é negra como está ferida. Duas pertinentes passagens das Escrituras nos ajudam a explicar o rosto ferido da Madona Negra. Uma delas está em Miquéias, apenas alguns versículos depois da referência a Magdal-eder, “fortaleza da filha de Sião”, por meio da qual o domínio do divino (através da casa de Davi) será um dia restaurado (Miquéias 4:8-10). Ele diz: “Com uma vara eles ferem a face do rei de Israel” (Miquéias 4:14).

Essa passagem da Escritura é com freqüência usada para referir-se a Jesus, que foi oficialmente torturado pelos soldados romanos. O servo sofredor descrito em Isaías 53, que os cristãos consideram o protótipo de Jesus, e a Madona Negra de Czestochowa são um par perfeito. A “negritude” simbólica do servo sofredor mencionado nessa passagem bíblica foi observada e aprimorada por São Bernardo de Claraval em seu comentário sobre o Cântico dos Cânticos, feito no século XII. Uma famosa pintura, O caminho do calvário, do pintor italiano Simone Martini (1284-1344), retrata Maria Madalena com um talho similar no lado direito do rosto.

Nessa obra, ela e Jesus usam vestes da mesma cor, mais uma vez um par perfeito. O X (símbolo do Christo) da cruz que Jesus carrega emoldura o torso de Maria Madalena, assim como o seu rosto aflito, marcado por uma cicatriz, é desproporcionalmente grande – como se ela, e não Jesus, fosse a figura central da cena. Parece que o tema do feminino maltratado não está representado casualmente por meio dessa outra Maria. São poucas as chances de que o X nessa pintura seja uma ocorrência  acidental do símbolo esotérico, ocultista dos hereges.

A segunda referência nas Escrituras que a cicatriz da Madona Negra nos faz lembrar está no Cântico dos Cânticos. A Noiva fala da procura por seu amor que partiu: “Encontraram-me os guardas que rondavam pela cidade; espancaram-me, feriram-me… os guardas dos muros” (Cântico dos Cânticos 5:7). Os “guardas dos muros” são, sem dúvida, os guardiões da Igreja oficial que não queriam permitir que o feminino, a Noiva, se unisse ao seu Amado e recebesse o status de parceira e igual. É provável que esse tema arquetípico dos amantes divinos separados e sua busca um pelo outro ocorra em todas as línguas e doutrinas sobre a Terra.

No século XII, havia uma curiosa lenda sobre uma noiva negra do Oriente Médio que procurava seu marido, um cruzado, de quem ela se separara por acidente no caminho entre sua terra natal e Londres. Diziam que essa era a história do pai de um popular herói-santo inglês martirizado, Tomás Becket, cujo conflito com o rei Henrique II foi muito bem documentado. Thomas B. Costain, um contador de histórias do século XII, escreveu um romance baseado nessa lenda. O nome da noiva negra era Miriam, e ela levava uma criança. Durante anos sua busca foi obstruída por mercadores ambiciosos, marinheiros desalmados, doenças e privações antes de, finalmente, se reunir ao marido inglês. Essa mulher era originária do Oriente Médio, e o romance é chamado The Black Rose (A Rosa Negra) 

O jovem herói era Walter de Gurney, um nobre que trouxe de volta de sua viagem à China (entre tantas possibilidades!) o segredo da fabricação do papel, o trabalho mais comum dos hereges albigenses. O tema romântico dos amantes divinos separados culmina no reencontro do casal: a terra infértil é curada. Seria mera coincidência o fato de Thomas Costain também ter escrito uma eloqüente história intitulada The Silver Chalice (O cálice de prata) sobre o cálice perdido que Jesus usou para beber na última Ceia? Talvez esse autor também fosse um iniciado ou, quem sabe, incrivelmente intuitivo! O fascínio pela princesa perdida e o Graal não decresceu com o passar dos séculos.

Contos de Fadas Europeus

Cinderela personifica a crença de que, quando a noiva for encontrada e devolvida ao príncipe, o reino será curado. Esse tema é recorrente em nossos contos de fadas. A questão essencial é a busca pela verdadeira companheira do príncipe. Outra variação ocorre na história  A bela adormecida, em que a princesa Aurora é picada por um fuso envenenado (símbolo ocultista para a passagem do TEMPO) e dorme por cem (alguns dizem mil) anos. No final, o príncipe precisa atravessar uma floresta de urzes COBERTOS DE “ESPINHOS”, que cresceram ao redor da amada e ocultaram a sua própria existência. Somente sua forte determinação consegue unir o casal (os dois princípios masculino e feminino divinos).

A imagem do impetuoso príncipe abrindo caminho pelos arbustos espinhentos, na tentativa de encontrar sua princesa perdida, a sua “outra metade”, é particularmente significativa para o nosso mundo moderno. O masculino ferido, brandindo a sua espada de maneira imprudente, não está apenas ferido e frustrado, mas tornou-se perigoso. Quanto mais cedo ele se unir ao seu complemento feminino perdido, maltratado, corrompido, prostituido e repudiado, melhor será! Em outro conto familiar, a princesa Branca de Neve é condenada à morte por sua madrasta. Quase sempre há uma madrasta maligna e invejosa ou uma bruxa feia (Lilith) tentando manter a princesa separada de seu companheiro – ela quer impedir que a Noiva tome o lugar que considera seu.

Essa mulher má vê a bela princesa através de seu espelho mágico e tenta e testa a donzela com uma brilhante maçã (símbolo ocultista para os prazeres mundanos) que a envenena. Somente a providencial chegada do príncipe salva Branca de Neve do terrível poder da maçã mortífera. Também rica em associações com a Noiva Perdida e Jesus é a famosa história de Rapunzel.

Agora, a donzela é aprisionada em uma torre por uma bruxa malvada (Lilith), que a roubou do próprio pai. Rapunzel é famosa por seu longo cabelo e sua bela voz, a “voz da Noiva” (Jeremias 33:11), tantas vezes mencionada no folclore. Um príncipe que estava de passagem ouve seu canto e se toma de uma poderoso amor e consegue convencê-la a jogar as tranças douradas (cor dourada, símbolo da sabedoria espiritual, da conexão com Chrito) para que ele consiga subir até à torre. Nesse aspecto, os sinais que chamam a atenção são o cabelo da moça e a torre, pois esses símbolos predominam nas tradições referentes a Maria, a Madalena (Magdal-Eder, a Torre de Sião), que secou os pés de Jesus com os seus próprios cabelos e cujo epíteto significa “torre” em hebraico.

Esses dois elementos também estão presentes nas estranhas histórias sobre Santa Bárbara, um exemplo clássico da forma como os símbolos e a identidade dos santos se misturam aos personagens dos contos folclóricos. Segundo as lendas, que hoje a Igreja considera espúrias (sendo que a própria igreja de Roma é ESPÚRIA  desde assuas raízes), Santa Bárbara foi uma mártir virgem, filha de um cavaleiro pagão do século III, na Síria. Ela queria ser cristã, e seu pai, horrorizado diante dessa possibilidade, trancou-a em uma torre. O sacerdote que ia em segredo instruí-la na fé precisava subir por suas tranças para alcançar a prisão. Por mais inacreditável que possa parecer, a história de Santa Bárbara só foi contestada em 1969, com a publicação do novo calendário da Igreja Católica Romana!

Durante séculos, ela foi retratada na iconografia cristã como uma bela mulher de cabelo fabulosamente longo, carregando nos braços a sua torre. O caso de Santa Bárbara tem outra característica interessante que considero de grande relevância. O nome dela que surgiu a partir da palavra grega bárbaros, de barbar, que significa “língua incompreensível”. … O nome Bárbara era considerado um adjetivo entre os antigos romanos, utilizado para designar toda a mulher que não era natural do império romano.: que, nos tempos clássicos, designava qualquer um que não falasse grego, ou seja, alguém procedente de outra região.

Em algumas versões da história de Cinderela, a pequena princesa perdida é chamada de Barbarela, porque era originária de um país longínquo. Ela é a desconhecida, a “estrangeira” exilada. Em uma das versões dessa história, Cinderela diz: “Sou uma princesa de uma terra distante. Vocês não me conhecem.” Talvez a conheçamos! Recordando que a palavra Magdala em hebraico significa “torre” (com conotações de “fortaleza”, ou “forte”), estou inclinada a acreditar que a estrangeira com o maravilhoso cabelo (vermelho) e a torre nos braços, retratada na iconografia medieval, é, na verdade, Madalena.

No Cântico dos Cânticos 8:10, a Noiva-Irmã diz sobre si mesma: “Eu era um muro, e os meus seios eram como as suas torres.” Ela se referindo a si própria como uma cidade murada, ou seja, Sião. A Noiva Negra – com a torre e o glorioso cabelo longo (e vermelho), que são seus símbolos, precedeu os relatos criados para explicar a história de Santa Bárbara. Ela é, com certeza, a Noiva-Irmã do Cântico dos Cânticos e a Magdal-eder de Miquéias – Maria, a filha exilada de Sião. Essa conclusão intuitiva é confirmada por uma curiosa prática característica da celebração do dia de Santa Bárbara na Europa Central.

Nessa data, 4 de dezembro, quando o chão está coberto de neve e as folhas das árvores já caíram, os habitantes de um vilarejo localizado em uma montanha na Silésia (Alemanha) saem para juntar galhos secos e levá-los para suas casas, onde são colocados na água. Ali, os galhos brotam em honra da Dama da Torre! Isso me parece uma lembrança folclórica da miraculosa florescência do cajado de Jessé (o galho seco dos reis de Judá) por meio da maternidade da Magdal-eder. Ela não é a noiva do conto de Rapunzel nem Santa Bárbara. Ela é Maria Madalena, a princesa estrangeira que veio (para a França) do outro lado do mar (da Palestina), cuja característica física mais marcante em todas as pinturas medievais é o glorioso cabelo vermelho que, um dia, ela usou para secar suas lágrimas que caíram nos pés de Cristo.

Como mais uma confirmação dessa confusão entre Santa Bárbara e Maria Madalena, é interessante observar que essa santa é a padroeira das fortificações. A lista de profissionais que a consideram sua patrona inclui arquitetos, pedreiros, engenheiros militares e artilheiros que constroem e defendem fortalezas, as “cidades muradas” e os castelos da história medieval. Até hoje, as cores do Corpo de Engenheiros do Exército dos Estados Unidos são vermelho e branco; seu emblema é um castelo com duas torres e o Baile da Artilharia é realizado no dia de Santa Bárbara – 4 de dezembro, nas bases militares norte-americanas por todo o planeta.

Não tenho intenção de reproduzir neste livro todos os contos de fadas de nossa infância. O meu objetivo é apenas mostrar a prevalência do tema da contraparte feminina do belo príncipe, a qual aparece sempre ferida, perdida ou aprisionada. As primeiras versões conhecidas da história de Cinderela na Europa datam aproximadamente do século IX. Nesse período, os reis merovíngios foram depostos e destituídos, enquanto sua herança era usurpada e destruída pelos herdeiros carolíngios de :Pepino de Herstal, em um suposto conluio com o Vaticano. Talvez aquela “madrasta” que tentou tantas vezes eliminar a pequena princesa merecesse sua péssima reputação.

Tentativas de Restaurar o Feminino “DIVINO”

No século XII, os esforços para resgatar a Noiva esquecida de Jesus foram frustrados pela ortodoxia e o dogmatismo assassino da igreja de Roma. Apesar disso, o culto do feminino DIVINO, louvada nas canções dos trovadores, continha as sementes de um novo sistema de valores que lutava para enraizar-se na Europa. Esse modelo enfatizava os ensinamentos dos Evangelhos, que pregavam igualdade e fraternidade (entre os gêneros), e dava também uma nova ênfase ao mundo, à carne e ao feminino. Floresciam temas como os de Carmina Burana e canções dos poetas errantes cujo lema era, significativamente, carpe diem (“aproveite o dia”).

Estudantes e artistas viajavam de um lugar para outra levando a mensagem do relacionamento/Eros, plantando as sementes que, mais tarde, derrubariam os muros do establishment. Os movimentos posteriores da Reforma foram influenciados por essas primeiras tentativas de quebrar as correntes da tirania do patriarcado. Um dos legados do movimento primitivo foi o repúdio protestante ao celibato (e, muitas vezes, ao masculino) como pré-requisito para se tornar um sacerdote cristão.

Como vimos, porém, os católicos ortodoxos obrigaram o culto do FEMININO divino a ser canalizado para o culto da Virgem Maria. Os aspectos de Mãe e Irmã do feminino foram honrados, mas o da Noiva foi sublimado. A Igreja não podia aceitar a esposa de carne e osso de Christo. A única noiva de Christo admitida pela hipocrisia romana era a própria Igreja – toda a comunidade de crentes – ou o seu microcosmo, a alma individual. A linguagem apaixonada da poesia fidalga e das imagens nupciais do jardim foram adotadas pelos místicos no final da Idade Média. E o relacionamento com Christo, o eterno e místico Noivo (e Criador) da alma humana, tornou-se individualizado, enquanto a doutrina do feminino divino foi rearticulada pela Igreja.

Somente um casamento místico com Christo era permitido. Em muitas pinturas da ascensão e coroação de Nossa Senhora, a Virgem Maria, a Mãe de Jesus, o canal do Christo é exaltada como a Noiva. Nessas obras, algumas vezes ela está sentada do lado esquerdo de Deus, oposto ao de Christo. Nesse lugar, é reconhecida como “mãe de todos”, modelo da Sagrada Mãe. Nesse sentido, a Virgem Maria ofereceu à Igreja Católica uma forte presença feminina, mas sempre ao arbítrio, controle e manipulação da hierarquia masculina.

Ao elevar a mãe de Jesus à condição de Rainha do Paraíso (em um dogma) no paradigma celestial, pelo menos uma (faceta) bela imagem do princípio do feminino divino foi preservada, embora a mulher de carne e osso do Christo  fosse deliberadamente renegada. Entretanto, apesar dessa negação, o povo nunca se esqueceu da mulher-criança exilada do lar, com o rosto coberto de fuligem, maltratada, corrompida por uma civilização de néscios esperando pelo cumprimento de seu destino: o seu casamento (união) divino com o príncipe celibatário, o homem “deus” aguardando a sua “deusa”.

Continua …


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